• Autor
  • O Blog

vicio da poesia

Tag Archives: Fernando Assis Pacheco

O sexo e a idade II — Picasso e soneto de Fernando Assis Pacheco

03 Segunda-feira Jun 2013

Posted by viciodapoesia in Convite à arte, Poetas e Poemas

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Fernando Assis Pacheco, Picasso

Dois bebedores catalães 1934-16Há dias, quando tomávamos cerveja, eu e o meu filho, ele explicava-me as exigências rituais do brinde berlinense sob pena de o não as observar conduzir a sete anos de mau sexo.
Isso, nem pensar! Os que sobram já são poucos, exclamei.

Na verdade, a vida é finita, e por mais ajuda de Viagra, o fim chegará. Aí resta a memória, e felizes os homens que possam lembrar para si algo parecido com o que este soneto/homenagem de Fernando Assis Pacheco (1937-1995) deixa transparecer.

Pus-vos a mão um dia sem saber
que tão robusta e certa artilharia
iria pelos anos fora ser
sinal também de lêveda alegria

amigos meus colhões quanto prazer
veio até mim em vossa companhia
a hora que tiver já de morrer
morra feliz por tanta cortesia

adeus irmãos é tempo de ceder
à dura lei que manda arrefecer
o fogo leviano em que eu ardia

camaradas leais do bem foder
o brio a fleuma cumpre agradecer
sem vós teria sido uma agonia

Lisboa
29-XI-94, 23-XII-94

Soneto publicado no livro Respiração Assistida, edição Assírio & Alvim, Lisboa, 2003.

1966-2Este desenho de Picasso, de 1966, é certeiro na elucidação do papel dos testículos na vida sexual de um homem (veja-se a figuração que conduz ao entumescimento ou não), como o soneto, de outra forma, refere.

Acrescento agora, em continuação do artigo anterior, algumas gravuras de Picasso (1881-1973), desta vez não de 1970, mas produzidas pouco antes, em 1968, tinha o pintor 87 anos, e conhecidas como Raphael e a Fornarina. Nesta série, ao par amoroso, pintor e amante, em actividade sexual, surge-nos uma figura tutelar observando os amorosos. Interpretações psicanalíticas falam do pai do artista, figura presente no seu imaginário e que aqui se liberta. Outras interpretações associam antes esta figuração à impotência sexual de Picasso que no anterior artigo referi. A leitura terá outra complexidade psicológica se se conhecer a biografia de Raphael, a tempestuosa relação com a que ficou conhecida por Fornarina, e a forma como as mulheres amadas por Picasso participaram da sua pintura, aspectos pontualmente abordados no blog e a que no futuro certamente voltarei. Por agora este pequeno grupo de gravuras permite ilustrar o poder do erótico na mente humana para além da idade biológica.

picasso11

picasso10

picass014

picass017

Rafael e a Fornarina 1968-15

Partilhar:

  • Tweet
  • E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • WhatsApp
  • Pocket
  • Telegram

Gostar disto:

Gosto Carregando...

A Prostituição na poesia (6) – As putas da Avenida de Fernando Assis Pacheco

12 Sábado Jan 2013

Posted by viciodapoesia in A mulher imaginada, Convite à arte, Poetas e Poemas

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Egon Schiele, Fernando Assis Pacheco

Dos muchachas en una manta de flecosA cidade transformou-se e a avenida da Liberdade já não é o que era quando Fernando Assis Pacheco (1937-1995) escreveu o soneto As putas da Avenida.

Hoje percorre a avenida o luxo da alta costura e das marcas com que o dinheiro se perfuma, escondendo os cheiros da sua origem. Mas as artérias não se libertam tão facilmente da vida que durante anos a elas se agarrou e, avançada a noite, regressam os ecos deste passado contado com mão de mestre na concisão do soneto.

AS PUTAS DA AVENIDA

Eu vi gelar as putas da Avenida
ao griso da Janeiro e tive pena
do que elas chamam em jargão a vida
com um requebro triste de açucena

vi-as às duas e às três falando
como se fala antes de entrar em cena
o gesto já compondo a voz de mando
do director fatal que lhes ordena

essa pose de flor recém-cortada
que para as mais batidas não é nada
senão fingirem lírios da Lorena

mas a todas o griso ia aturdindo
e eu que do trabalho vinha vindo
calçando as luvas senti tanta pena

Este soneto de Fernando Assis Pacheco encontra-se no livro Variações em Sousa de 1987, republicado em A Musa Irregular, 3ªedição com as correcções do autor, por Assírio & Alvim, Lisboa, 2006.

 

Partilhar:

  • Tweet
  • E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • WhatsApp
  • Pocket
  • Telegram

Gostar disto:

Gosto Carregando...

Uma ode à poesia de Pablo Neruda

21 Quarta-feira Mar 2012

Posted by viciodapoesia in Convite à arte, Poetas e Poemas

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Fernando Assis Pacheco, Luis Pignatelli, Malevich, Pablo Neruda

Parece que hoje é o dia da Poesia para aqueles que não a lêem. Assinalemos tão auspiciosa data com um dos poemas da minha vida: Ode à Poesia de Pablo Neruda (1904-1973).

Para quem se interroga sobre questões utilitárias como por exemplo: Poesia? Para que serve? Pablo Neruda acompanha-o nesta ode:

…

Yo te pedí que fueras
utilitaria y útil,
como metal o harina,
dispuesta a ser arado,
herramienta,
pan y vino,
dispuesta, Poesía,
a luchar cuerpo a cuerpo
y a caer desangrándote.

…

E mais à frente responde. E em resultado permanece no coração dos homens que o leram.

Acompanham a poesia de Neruda algumas pinturas de Kazimir Malevich (1878-1935) representando trabalhadores manuais.

Não fora a sua extensão, acrescentaria o poema O Homem Invisível com que abre o livro Odes Elementares onde esta Ode à Poesia se contém. Fica o alvitre para um leitor curioso o procurar e este excerto:

…

eu não tenho importância

nem tempo

para os meus assuntos,

de noite e de dia

tenho que apontar tudo o que se passa,

e não esquecer ninguém.

É certo que de repente

me canso,

fico a olhar as estrelas,

estendo-me na relva, passa

um insecto cor de violino,

pouso o braço

sobre um pequeno seio

ou enlaço a cintura

da minha amada,

e vejo o veludo

cruel

da noite que estremece

com as suas constelações geladas,

então

sinto subir à minha alma

a onda dos mistérios,

a infância,

o pranto nos recantos,

a adolescência triste

e o sono invade-me,

durmo

…

(Tradução de Luis Pignatelli)

ODE À POESIA

Quase cinquenta anos

a caminhar

contigo, Poesia.

Ao princípio

enleavas-me os pés

e eu caía de borco

na terra escura

ou enterrava os olhos

no charco

para ver as estrelas.

Mais tarde estreitaste-me

com os dois braços da amante

e subiste

pelo meu sangue

como uma trepadeira.

No minuto seguinte

convertias-te em taça.

 

Belo

foi

ires escorrendo sem te consumires,

ires entregando a tua água inesgotável,

ires vendo que uma gota

caía sobre um coração queimado

e dessas mesmas cinzas revivia.

Porém

nem isso me bastou.

Tanto andei contigo

que te perdi o respeito.

Deixei de ver-te como

náiade vaporosa,

pus-te a fazer de lavadeira,

a vender pão nas padarias,

a fiar com as simples tecedeiras,

a bater o ferro na metalurgia.

E vieste comigo

andando pelo mundo,

mas já não eras

a florida

estátua da minha infância.

Falavas

agora

com voz férrea.

As tuas mãos

foram duras como pedras.

O teu coração

foi um abundante

manancial de sinos,

fizeste para mim pão com fartura,

ajudaste-me

a não cair de borco,

procuraste-me

companhia,

não uma mulher,

não um homem,

mas milhares, milhões.

Juntos, Poesia,

fomos

ao combate, à greve,

ao desfile, aos portos,

à mina,

e eu ri-me quando saíste

com a testa suja de carvão

ou coroada com serrim fragrante

das serrações.

Já não dormíamos na estrada.

Esperavam-nos grupos

de operários com camisas

recém-lavadas e bandeiras vermelhas.

 

E tu, Poesia,

até aí tão desgraçadamente tímida,

marchaste

à cabeça

e todos

se habituaram ao teu traje

de estrela quotidiana,

pois mesmo que algum relâmpago denunciasse a tua família

tu cumpriste a tarefa,

andando passo a passo com os homens.

Eu pedi-te que fosses

utilitária e útil,

como metal ou farinha,

pronta a ser arado,

ferramenta

pão e vinho,

pronta, Poesia,

a lutar corpo a corpo

e a cair esvaída em sangue.

 

E agora,

Poesia,

obrigado, esposa,

irmã ou mãe

ou noiva,

obrigado, onda do mar,

flor branca e bandeira,

motor de música,

grande pétala de oiro,

sino submarino,

celeiro inesgotável,

obrigado

 terra de cada um

 dos meus dias,

 vapor celeste e sangue

 dos meus anos,

 porque me acompanhaste

 da mais enrarecida altura

 à simples mesa

 dos pobres,

 porque puseste na minha alma

 sabor ferruginoso

 e fogo frio,

 porque me ergueste

 à altura insigne

 dos homens vulgares,

 Poesia,

 porque a teu lado

 enquanto me gastava

 tu foste sempre

 aumentando essa frescura firme,

 esse ímpeto cristalino,

 como se o tempo

 que a pouco e pouco me converte em terra

 fosse deixar correr eternamente

as águas do meu canto.

Tradução de Fernando Assis Pacheco

 

ODE À POESIA (original)

Cerca de cincuenta años             
caminando
contigo, Poesía.
Al principio
me enredabas los pies
y caía de bruces
sobre la tierra oscura
o enterraba los ojos
en la charca
para ver las estrellas.
Más tarde te ceñiste
a mí con los dos brazos de la amante
y subiste
en mi sangre
como una enredadera.
Luego
te convertiste
en copa.

Hermoso
fue
ir derramándote sin consumirte,
ir entregando tu agua inagotable,
ir viendo que una gota
caída sobre un corazón quemado
y desde sus cenizas revivía.
Pero no me bastó tampoco.
Tanto anduve contigo
que te perdí el respeto.
Dejé de verte como
náyade vaporosa
te puse a trabajar de lavandera,
a vender pan en las panaderías,
a hilar con las sencillas tejedoras,
a golpear hierros en la metalurgia.
Y seguiste conmigo
andando por el mundo,
pero tú ya no eras
la florida
estatua de mi infancia.
Hablabas
ahora
con voz férrea.
Tus manos
fueron duras como piedras.
Tu corazón
fue un abundante
manantial de campanas,
elaboraste pan a manos llenas,
me ayudaste a no caer de bruces,
me buscaste
compañía,
no una mujer,
no un hombre,
sino miles, millones.
Juntos, Poesía,
fuimos
al combate, a la huelga,
al desfile, a los puertos,
a la mina,
y me reí cuando saliste
con la frente manchada de carbón
o coronada de aserrrín fragante
de los aserraderos.
Y no dormíamos en los caminos.
Nos esperaban grupos
de obreros con camisas
recién lavadas y banderas rojas.

Y tú, Poesía,
antes tan desdichadamente tímida,
a la cabeza
fuiste
y todos
se acostumbraron a tu vestidura
de estrella cotidiana,
porque aunque algún relámpago delató tu familia
cumpliste tu tarea,
tu paso entre los pasos de los hombres.
Yo te pedí que fueras
utilitaria y útil,
como metal o harina,
dispuesta a ser arado,
herramienta,
pan y vino,
dispuesta, Poesía,
a luchar cuerpo a cuerpo
y a caer desangrándote.

Y ahora,
Poesía,
gracias, esposa,
hermana o madre
o novia,
gracias, ola marina,
azahar y bandera,
motor de música,
largo pétalo de oro,
campana submarina,
granero
inextinguible,
gracias,
tierra de cada uno
de mis días,
vapor celeste y sangre
de mis años,
porque me acompañaste
desde la más enrarecida altura
hasta la simple mesa
de los pobres,
porque pusiste en mi alma
sabor ferruginoso
y fuego frío,
porque me levantaste
hasta la altura insigne
de los hombres comunes,
Poesía,
porque contigo
mientras me fui gastando
tú continuaste
desarrollando tu frescura firme,
tu ímpetu cristalino,
como si el tiempo
que poco a poco me convierte en tierra
fuera a dejar corriendo eternamente
las aguas de mi canto.

Noticia bibliográfica:

Esta Ode à Poesia foi, que eu saiba, traduzida duas vezes para português, ambas as traduções feitas por poetas, e publicadas na mesma editora,  Publicações D.Quixote.

Uma, a tradução de Fernando Assis Pacheco encontra-se na Antologia Breve publicada na saudosa colecção cadernos de poesia. A outra consta da tradução feita por Luis Pignatelli (1935-1993) de Odes Elementales, publicada em 1977 com o titulo Odes Elementares.

 

Partilhar:

  • Tweet
  • E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • WhatsApp
  • Pocket
  • Telegram

Gostar disto:

Gosto Carregando...

Soneto 2 de Fernando Assis Pacheco

05 Sábado Nov 2011

Posted by viciodapoesia in Convite à fotografia, Erótica, Poetas e Poemas

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Fernando Assis Pacheco

Soneto 2

Os trabalhos de amor são os mais leves

de quantos algum dia pratiquei

na cama as alegrias fazem lei

e se me queixo é só de serem breves

 

eu vivo atado às tuas mãos suaves

num nó de que este corpo já não sai

ferve o arco do sol a tarde cai

ardem voando pelo céu as aves

 

mágoas outrora muitas fabriquei

e em países salobros jornadeei

ao dorso das tristezas almocreves

 

a vez em que te amei um outro fui

comigo fiz a paz nada mais dói

e os trabalhos de amor nunca são graves

 Lisboa

12-X93, 23-XII-93

Soneto 2 de Fernando Assis Pacheco (1937-1995) publicado em RESPIRAÇÃO ASSISTIDA, edição Assírio & Alvim, 2003.

 

Partilhar:

  • Tweet
  • E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • WhatsApp
  • Pocket
  • Telegram

Gostar disto:

Gosto Carregando...

Visitas ao Blog

  • 2.061.321 hits

Introduza o seu endereço de email para seguir este blog. Receberá notificação de novos artigos por email.

Junte-se a 874 outros subscritores

Página inicial

  • Ir para a Página Inicial

Posts + populares

  • A valsa — poema de Casimiro de Abreu
  • Camões - reflexões poéticas sobre o desconcerto do mundo
  • Escultura votiva da pré-história mediterrânica

Artigos Recentes

  • Sonetos atribuíveis ao Infante D. Luís
  • Oh doce noite! Oh cama venturosa!— Anónimo espanhol do siglo de oro
  • Um poema de Salvador Espriu

Arquivos

Categorias

Create a free website or blog at WordPress.com.

  • Seguir A seguir
    • vicio da poesia
    • Junte-se a 874 outros seguidores
    • Already have a WordPress.com account? Log in now.
    • vicio da poesia
    • Personalizar
    • Seguir A seguir
    • Registar
    • Iniciar sessão
    • Denunciar este conteúdo
    • Ver Site no Leitor
    • Manage subscriptions
    • Minimizar esta barra
 

A carregar comentários...
 

    %d bloggers gostam disto: