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Lesebuch (Livro de leitura) de J. W. Goethe

08 Sexta-feira Set 2017

Posted by viciodapoesia in Poesia Antiga

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Goethe, Omar Khayyam

O mais singular livro dos livros
É o Livro do Amor;
Li-o com toda a atenção:
Poucas folhas de alegrias,
De dores cadernos inteiros;
Apartamento faz uma secção,
Reencontro! um breve capítulo,
Fragmentário. Volumes de mágoas
Alongados de comentários,
Infinitos, sem medida.
Ó Nisami ! – mas no fim
Achaste o justo caminho;
O insolúvel, quem o resolve?
Os amantes que tornam a encontrar-se.

De Divan Ocidental-Oriental (West-Östlichen Divan (1814-1836)) de J. W. Goethe (1749-1832) vem esta síntese dos efeitos do amor na vida de cada um, retomando as admiráveis lições de Rumi e Omar Khayyam, de condensar supremos ensinamentos nos versos de um pequeno poema.

Reflexão de maturidade sobre o amor, este Divan de Goethe dá conta de como viver o amor nos muda o mundo:

Que maravilha é ver
Que maravilha é ver todo este mundo!
Mais belo que nenhum é o mundo dos poetas:
Variegados, claros ou prateados, ao fundo,
Os campos, dia e noite, têm luzes a brilhar.
Tudo me é belo, hoje; pudesse assim ficar!
Para ver hoje assim, o Amor me deu lunetas.

Remetendo directamente para a poesia de Omar Khayyam, vem este

Se estou sozinho

Se estou sozinho,
Que melhor cantinho?
O meu vinho
Bebo-o sozinho,
Ninguém me põe impedimentos,
E  tenho os meus próprios pensamentos.

Ao falar em Omar Khayyam a propósito deste poema de Goethe, poderia recordar tantos dos seus ruba’iyat, mas retenho este ruba’i em especial:

Dizem-me: “Não bebas mais, Kayam!”
Eu respondo: “Ao beber
ouço o que me dizem as rosas   as tulipas e os jasmins
escuto mesmo aquilo que a minha amada não me pode dizer”

Não sei se seria o caso com Goethe e Marianne von Willemer, que, quando afastado dela lhe aconteceria:
“escuto mesmo aquilo que a minha amada não me pode dizer”

Foi para esta Marianne von Willemer que o poeta escreveu em 15 de Setembro de 1815 a metáfora da fusão de dois amantes simbolizada na folha de Gingko Biloba:
Será um ser vivo apenas / Em si mesmo em dois partido?
Serão dois que se elegeram / E nós julgamos num unidos?

Gingko Biloba

A folha desta árvore que de Leste
Ao meu jardim se veio afeiçoar,
Dá-nos o gosto de um sentido oculto
Capaz de um sábio edificar.

Será um ser vivo apenas
Em si mesmo em dois partido?
Serão dois que se elegeram
E nós julgamos num unidos?

Para responder às perguntas
tenho o sentido real:
Não vês por meus cantos como
Sou uno e duplo, afinal?

Deixo-vos com o que suponho ser o fac-simile do poema:

Noticia bibliográfica
As traduções dos poemas de Goethe são de Paulo Quintela, e constam da 2ªedição corrigida de Poemas publicada em 1958 Por Ordem da Universidade de Coimbra.

A poesia de Omar Khayyam consta da antologia O vinho e as Rosas – Antologia de poemas sobre a embriaguês organizada por Jorge Sousa Braga e luxuosamente editada por Assírio & Alvim em 1995.

Para o nome deste poeta não encontrei grafia normalizada, e surge nas edições em livro tanto Omar Kayam ou Khayyam, como Umar-i Kahayyam, ou em espanhol, Omar Jayyam.

 

Nota Final

Este artigo foi antes publicado no blog em Junho de 2012.

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Do Homem e do Divino com Goethe

25 Segunda-feira Abr 2016

Posted by viciodapoesia in Poesia Antiga

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Boucher, Goethe

Boucher - Homem sentado com braços cruzados 450pxQuando numa leitura profissional me inteirava dos desafios de engenharia vencidos na execução do novo complexo de redes e estações de metro London’s Crossrail, ainda em construção em Londres, e da dimensão multidisciplinar da obra, simultaneamente comparava estes trabalhos com a tragédia recente na Índia em consequência do desmoronamento de um viaduto também em construção num ambiente urbano.

As assimetrias no mundo são, pelo que se pode intuir, fortemente agravadas por factores exteriores à biologia, onde os valores morais por detrás da aplicação do conhecimento fazem a diferença.

Educação e crença caminham de mãos dadas na vida de cada um, mas, como escreveu Goethe (1749-1832) no poema que hoje transcrevo: … somente o homem / Pode o impossível: / Só ele distingue, / Escolhe e julga; / E pode ao instante / Dar duração.

Neste poema, o poeta dá conta do lugar relativo de homens e divindade:

…

E nós veneramos

Os Imortais

Como se homens fossem,

Em grande fizessem

O que em pequeno o melhor de nós

Faz ou deseja.

…

Acentua o poema noutro passo, a indiferença da natureza comandada pelas forças divinas, a que alguns chamam acaso:

…

Pois insensível

É a natureza:

O sol ‘spalha luz

Sobre maus e bons,

E ao criminoso

Brilham como ao santo

A luz e as ‘strelas.

…

Termina o poema, tal como abre, exortando o homem ao seu melhor, para assim ser exemplo de divindade:

…

Que o homem nobre

Seja caridoso e bom!

Incansável crie

O útil, o justo,

E nos seja exemplo

Dos seres pressentidos.

 

Este poema, O Divino, juntamente com o poema Prometeu, do qual transcrevo a última estrofe:

…

Pois aqui estou! Formo Homens

À minha imagem,

Uma estirpe que a mim se assemelhe:

Para sofrer, para chorar,

Para gozar e se alegrar,

E pra não te (*) respeitar,

Como eu!

 

(*) Zeus

 

e ainda com o poema Limites da Humanidade, formam uma espécie de trilogia sobre a relação do homem com a divindade na obra poética de Goethe.

Antes de vos entregar à leitura integral do poema O Divino, transcrevo uma estrofe de Limites da Humanidade:

 

Pois com Deuses

Não deve medir-se

Homem nenhum!

Ergue-se ele ao alto

Até tocar

Co’a cabeça os astros,

Nenhures se prendem

Os pés incertos,

E com ele brincam

Nuvens e ventos.

 

 

Sabendo, pois, como o poeta vê o Divino, segue o poema integral.

O Divino

 

Nobre seja o homem,

Caridoso e bom!

Pois isso apenas

É que o distingue

De todos os seres

Que conheçemos.

 

Glória aos incógnitos

Mais altos seres

Que pressentimos!

Que o homem se lhe iguale!

Seu exemplo nos ensine

A crer neles!

 

Pois insensível

É a natureza:

O sol ‘spalha luz

Sobre maus e bons,

E ao criminoso

Brilham como ao santo

A luz e as ‘strelas.

 

Vento e torrentes,

Trovão e saraiva

Rugem seu caminho

E agarram,

Velozes passando,

Um após outro.

 

Tal a sorte às cegas

Lança mãos à turba

E agarra os cabelos

Do menino inocente

Ou a fronte calva

Do velho culpado.

 

Por eternas leis,

Grandes e de bronze,

Temos todos nós

De fechar os círculos

Da nossa existência.

 

Mas somente o homem

Pode o impossível:

Só ele distingue,

Escolhe e julga;

E pode ao instante

Dar duração.

 

Só ele é que pode

Premiar o bom,

Castigar o mau,

Curar e salvar,

Unir com proveito

Tudo o que erra e divaga.

 

E nós veneramos

Os Imortais

Como se homens fossem,

Em grande fizessem

O que em pequeno o melhor de nós

Faz ou deseja.

 

Que o homem nobre

Seja caridoso e bom!

Incansável crie

O útil, o justo,

E nos seja exemplo

Dos seres pressentidos.

 

Todas as traduções transcritas são de Paulo Quintela.

in J. W. Goethe (1749-1832), Poemas, 2ª edição corrigida e ampliada, Acta Universitatis Conimbrigensis, 1958.

Abre o artigo a imagem de um desenho de François Boucher (1703-1770).

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Goethe em Itália — um poema

12 Segunda-feira Ago 2013

Posted by viciodapoesia in Erótica, Poesia Antiga

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Goethe, Tischbein

Tischbein_Johann_Heinrich_Wilhelm-Goethe_in_the_Roman_CampagnaNa excitação de nova viagem Itália releio Goethe (1749-1832). Se a Viagem a Itália é um prazer, a poesia que ela inspirou é um apetite. É dessas suas Elegias Romanas, que passam por poesia erótica, que vos trago a VI, traduzida por Manuel Malzbender, pois Paulo Quintela, nas suas apreciadas traduções de Goethe passou-lhe por cima: traduziu a V e VII. Da sua leitura talvez se perceba porquê. Aí fica.

Feliz me sinto agora, inspirado em solo clássico.
Com voz mais alta e sedutora me falam passado e presente.
Sigo o conselho dos Antigos, folheio as suas obras
Com mão solitária, todos os dia, com renovado prazer.
Mas durante a noite prefiro ter as mãos em outros lados,
E se eu só aprender metade, terei o dobro do prazer.
E não aprendo eu quando contemplo as deliciosas formas
Do peito, quando a mão desliza pelas ancas?
Só então entendo verdadeiramente o mármore, penso e comparo,
Vejo com olhos sensitivos, sinto com mãos videntes,
E quando a amada me rouba algumas horas do dia,
Dá-me as horas da noite em compensação.
Não nos beijamos apenas, também temos conversas sérias,
E quando dorme a minha querida, ao seu lado penso em muitas coisas,
Muitas vezes também compus versos nos seus braços
E as suas costas, dedilhando contei eu
Suavemente o hexâmetro, e quando a bela dormita
O seu sopro incendeia profundamente o meu peito.
Então o amor acende a lâmpada e recorda os tempos
Em que prestou o mesmo favor ao seu Triunvirato(1)

Gosto sobretudo de quando o amor acende a lâmpada!

(1) Diz o tradutor que se trata dos três poetas romanos com vasta obra erótica: Catulo, Tíbulo e Propércio.

A eles iremos um destes dias, mas talvez apenas em espanhol se não conseguir tradução portuguesa que me satisfaça.

Na pintura de abertura Tischbein (Johann Heinrich Wilhelm Tischbein (1751-1828) ) mostra supostamente Goethe em Itália e, na pose especiosa, criou a imagem que ao poeta ficou irremediavelmente associada.

O poema foi publicado em Goethe, Erótica Romana, Cavalo de Ferro Editores, Lisboa 2005.

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Fausto, pretexto para dar a cara.

25 Quinta-feira Ago 2011

Posted by viciodapoesia in Cânone XXI, Crónicas, Poesia Antiga

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Fausto, Goethe

São múltiplos os pretextos porque regresso ao Fausto de Goethe.  Aproxima-me o fim de mais um ano biológico e com ele o involuntário balanço eivado de alguma melancolia, E apossa-se de mim uma olvidada/ Saudade desse reino calmo e grave / Dos Espíritos.

E é no poema Dedicatória  com que abre Fausto  que me revejo, a mim e à minha circunstância:

Surgis de novo, figuras fugidias / … / Trazeis imagens de outra felicidade,/ E ressurge muita sombra querida; / Voltam primeiro amores, velha amizade,/ Como uma antiga lenda, meio perdida; / Renasce a dor, a mágoa insiste e invade / A errância labiríntica da vida,

 

Eis o poema:

Dedicatória

Surgis de novo, figuras fugidias
Que ao turvo olhar vos mostrastes outrora.
Cabem em meu coração tais fantasias?
Serei capaz de vós reter agora?
Quereis entrar! Seja, reinai sem peias,
Vós, que subis das brumas da memória;
A minha alma renasce, emocionada
Pelo sopro mágico da vossa cavalgada.


Trazeis imagens de outra felicidade,
E ressurge muita sombra querida;
Voltam primeiro amores, velha amizade,
Como uma antiga lenda, meio perdida;
Renasce a dor, a mágoa insiste e invade
A errância labiríntica da vida,
E nomeia os amigos que a má sorte
Privou de gozos e entregou cedo à morte.


Não ouvem os meus cantos de agora
As almas para quem primeiro cantei;
Disperso o grupo da primeira hora,
Mudos os ecos que então despertei.
A turba ignota o meu canto devora,
E nem com seu aplauso me alegrei;
E os que os meus versos amaram a fundo,
Se ainda vivem erram por esse mundo.


E apossa-se de mim uma olvidada
Saudade desse reino calmo e grave
Dos Espíritos, e a minha ciciada
Canção, eólia harpa, é voo de ave;
Estremeço, ao pranto a lagrima ajuntada
O peito austero torna leve e suave:
O que possuo dilui-se na distância,
E o que fugira ganha forma e substância.

É uma dívida que os portugueses nunca pagarão, a que têm para com João Barrento,  e a sua actividade como tradutor, sobretudo a sublime tradução de Fausto de Goethe. Deixo-lhe aqui o meu enorme obrigado.

Noticia bibliográfica: Esta tradução do poema consta da edição de Fausto de Johann W. Goethe publicada por Relógio d’Água, em 1999, sendo a tradução, introdução e glossário de João Barrento.

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