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Tag Archives: Francisco Rodrigues Lobo

Um poema de A Primavera de Francisco Rodrigues Lobo

28 Quinta-feira Jul 2016

Posted by viciodapoesia in Poesia Antiga

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Francisco Rodrigues Lobo

HILLIARD, Nicholas 1547-1619 - miniatura sobre pergaminho 1588 300pxSabemos todos que as horas não têm sempre a mesma duração. E se as horas de prazer voam ligeiras, as de espera, ansiedade, desgosto ou desengano, de dilatadas, parecem eternidade.
Dessa variabilidade da duração do tempo em função de estados de alma nos fala o poema de Francisco Rodrigues Lobo (1580-1621) que a seguir transcrevo.
Se esta reflexão poética é de todos os tempos, as quatro oitavas que seguem têm a particularidade de glosar o primeiro quarteto de um soneto arqui-popular à época — Horas breves do meu contentamento — de autoria desconhecida, e a certa altura também atribuído a Camões, e no qual, com algumas nuances, esta mesma reflexão se escreve.
Ao soneto e às suas variadas versões irei proximamente. Por agora entrego-vos ao poema de Francisco Rodrigues Lobo.

 

 

Se sois, horas, da mesma natureza
Do tempo vão que passa e não se sente,
Como só no meu mal tendes firmeza
E tomais natureza diferente?
Como assim não fugis desta tristeza
E desta vida em tudo descontente,
Se mais leves fugis que o leve vento,
Horas breves do meu contentamento?

Quanto para saber-vos me faltava
Naquele breve espaço que vos vi!
Como do tempo então me descuidava,
Cuidei que todo fosse sempre assi.
Quanto fugia o bem e o mal durava
Pareceu-me depois que vos perdi.
Porque amor a meu mal tudo encaminha,
Nunca me pareceu quando vos tinha.

Ai duros, rigorosos desenganos,
A que tempo cortais minha esperança!
Saber que em tanta pena, em etantos danos
O mal só dura, o bem nunca descansa!
Horas que para o mal durais mil anos
E em meu gosto fazeis logo mudança,
Quão mal imaginara esta alma minha
Que vos visse mudada tão asinha!

Tudo em vós se trocou, tudo é mudado,
A vida, o gosto e o desejo dela,
O rosto , o parecer, o trajo, o gado,
E também se mudou a minha estrela.
Mudar-se tudo, enfim, me era forçado,
Que juízo não vale, força ou cautela
Pera sustentar sempre um sofrimento
Em tão compridos anos de tormento.

 

Transcrito de Francisco Rodrigues Lobo, A Primavera, edição de Maria Emília Gonçalves Pires, Vega Editora, Lisboa, 2003.

Abre o artigo a imagem de uma pintura miniatura (aguarela sobre pergaminho) por Nicholas Hilliard (1547-1619), feita em 1588, contemporânea próxima do poema. A atitude do jovem pintado reflecte admiravelmente o espírito que a meditação do poema transporta.

A pintura pertence à colecção do museu Victoria and Albert de Londres. A ficha da obra disponibilizada pelo museu on-line lê-se com proveito.

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A fermosa Lianor

19 Segunda-feira Abr 2010

Posted by viciodapoesia in Cânone XXI

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Camões, Francisco Rodrigues Lobo

Ainda recentemente, em conversa sobre a poesia aprendida na escola e que acompanha tantos de nós pela vida fora, se discutia a autoria do poema  “Descalça vai para a fonte / Lianor pela verdura / …”. A memória já não é o que era, e uns, que a poesia era de Luís de Camões, outros que era de Rodrigues Lobo.

A discussão ficou em aberto.

Chegado a casa, tirei-me de cuidados e fui à procura. Aqui deixo a solução da controvérsia que ficou por resolver.  Ambos os partidos tinham razão.

 

Descalça vai para a fonte

Lianor pela verdura;

Vai fermosa e não segura.

é o mote de autoria desconhecida que tanto Camões como Rodrigues Lobo glosaram, ambos em metro de redondilha maior e com resultado de igual mérito.

Tem nelas a poesia portuguesa duas obras-primas, em minha modesta opinião.

Ei-las:

Luís de Camões

Mote

Descalça vai para a fonte

Lianor pela verdura;

Vai fermosa e não segura.


Voltas

Leva na cabeça o pote,

O testo nas mãos de prata,

Cinta de fina escarlata

Sainho de chamalote:

Traz a vasquinha de cote

Mais branca que a neve pura

Vai fermosa e não segura.


Descobre a touca a garganta,

Cabelos de ouro entrançado,

Fita de cor de encarnado,

Tão linda que o mundo espanta.

Chove nela graça tanta,

Que dá graça à fermosura.

Vai fermosa e não segura.

 

E agora a inspiração de Francisco Rodrigues Lobo

 

Vilancete

Descalça vai para a fonte

Lianor pela verdura;

Vai fermosa e não segura.


A talha leva pedrada,

Pucarinho de feição,

Saia de cor de limão,

Beatilha soqueixada.

Cantando de madrugada

Pisa as flores na verdura

Vai fermosa e não segura.


Leva na mão a rodilha,

Feita da sua toalha;

Com uma sustenta a talha,

Ergue com outra a fraldilha.

Mostra os pés por maravilha

Que a neve deixam escura

Vai fermosa e não segura.


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