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O tempo e o encanto que falece num poema de Karle Wilson Baker

29 Domingo Jul 2018

Posted by viciodapoesia in Poetas e Poemas

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Fernando Botero, Karle Wilson Baker

Ter encanto é uma qualidade que apenas ou outros podem reconhecer em nós. Dá-nos certamente satisfação, e há quem viva mal quando não sente esse reconhecimento.
Perder o encanto com o tempo parece um lugar comum de aceitação universal. Ninguém se pergunta porque nos parece isso natural. E será?
O encanto, que não a beleza física, é uma soma de variadas qualidades onde cada um valoriza umas mais que outras. E no entanto, nenhum de nós consegue aceitar que o encanto aumenta à medida que envelhecemos.

 

Há algum tempo, num artigo de opinião do NYTimes, uma investigadora universitária dava conta dos resultados de uma pesquisa sobre as reações a palavras para designar as pessoas mais velhas, e o próprio envelhecimento. A única exclusão era a palavra old (velho) por, no entender dos estudiosos, a palavra carregar elevado peso pejorativo, e tratava-se de a substituir na linguagem comum.
Quando li o artigo, este trazia mais de mil comentários em muito poucos dias, e por uma vez, cada comentário era mais preciso, elegante, e lúcido que o artigo, sendo os comentários, afirmativos à uma do orgulho de ser velho, aceitando a palavra velho com naturalidade e ridicularizando todos e cada um dos termos alternativos propostos no estudo.

 

Ter envelhecido, e tirar proveito da vida vivida é onde reside o encanto; na manifestação vigorosa da satisfação de aproveitar o melhor que a vida entretanto trouxe está o segredo. E isso, só o sabemos depois de a vida viver.

 

Num poema de início do século XX, Karle Wilson Baker (1878-1960), dá conta do desejo de ganhar encanto com o tempo:
Let me grow lovely, growing old — / …

 

deixando uma interrogação para a qual não tem resposta:
…
Why may not I, as well as these,
Grow lovely, growing old?

 

Na verdade, é cada um de nós quem precisa de a encontrar, e perceber como tal resposta pode mudar o sentido da vida que vivemos.

 

 

Poema

Que eu tenha mais encantos, com o tempo —
Como sucede às coisas preciosas:
Oiro, marfim, as sedas, como as rendas
Ganham em não ser novas.

Que saudáveis que são as árvores velhas,
E as velhas ruas têm outro assento;
Porque não hei-de então ser como elas,
Que têm mais encantos com o tempo?

Tradução de Herculano de Carvalho
in Oiro de vário tempo e lugar, Asa Editores, 2001.

 

 

Poema original

Let me grow lovely, growing old —
So many fine things do:
Laces, and ivory, and gold,
And silks need not be new;

And there is healing in old trees,
Old streets a glamour hold;
Why may not I, as well as these,
Grow lovely, growing old?

 

Abre o artigo a imagem de uma pintura de Fernando Botero (1932), Casal dançando.

 

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O namorado e o tempo num poema de Murilo Mendes

08 Terça-feira Ago 2017

Posted by viciodapoesia in Poetas e Poemas

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Fernando Botero, Murilo Mendes

Retomo uma vez mais o envelhecimento e o amor, dando conta desta circularidade que envolve a humanidade: amamos novos, a idade avança, e o amor transforma-se, desafiando-nos a uma aprendizagem constante do outro. A vida que o amor viveu é sempre outra quando o amor se vive. Não há repetições nem efeitos miméticos, apenas desafios no aconchegarmos-nos ao outro que agora é, e nos enche a alma.
Isto, sabido com a idade, nunca está presente nos começos de uma relação, quando apenas o esplendor do agora funciona como ignição, e justamente nos vem lembrar Murilo Mendes (1901-1975) no poema O namorado e o tempo.

 

 

 

O namorado e o tempo

 

O namorado contempla
o corpo da namorada
vê o corpo como está,
não vê como o corpo foi
nem com o corpo será.

Se aquele corpo amanhã
mudar de peso, de forma
mudar de ritmo e de cor,
o namorado, infeliz,
vai sofrer mesmo demais:
não calculou o futuro,
a mulher quebrou o encanto,
ele só vê a mulher
no momento em que a vê.

 

 

Trata-se de um poema sobre o óbvio que permanentemente esquecemos: o efémero da aparência física de cada um, e o implícito desejo da sua imutabilidade quando a atracção estética é o motor. Se o amor acontece, o encanto não se perde, apenas se transforma.

 

 

Poema transcrito de 366 poemas que falam de amor, antologia organizada por Vasco Graça Moura, Quetzal editores, Lisboa, 2003.

Abre o artigo a imagem de uma pintura de Fernando Botero (1932).

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Retratos de família por Fernando Botero — o humano por detrás do grotesco

05 Quinta-feira Dez 2013

Posted by viciodapoesia in Convite à arte, Poetas e Poemas

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Eduardo Carranza, Fernando Botero

Botero 00La cabeza hermosissima caía / del lado de los sueños;

Abro com estes versos de um soneto do colombiano Eduardo Carranza (1913-1985) uma curta digressão pela pintura de Fernando Botero (1932).

A pintura de Fernando Botero utiliza uma linguagem tipificada na representação do corpo humano que a identifica de imediato. Trata-se de uma representação grotesca do corpo que a ternura de alguns olhares consegue mitigar. A utilização de cores puras e frequentemente contrastadas, preenchendo um desenho preciso, criam uma representação que choca ao primeiro olhar, pelo menos em grande parte da sua obra.

Grotescos, aqueles seres, mais bonecos que gente, e poderiam fazer parte de uma linha de brinquedos infantis, inspiram uma enorme ternura.

Na verdade, belos ou feios, sofisticados ou ridículos na aparência e atitudes, somos todos humanos, e é na alma que nos revemos ou encontramos.

No que imaginar possam, deixo-vos a companhia desta humanidade inventada por Botero. No final o soneto de Eduardo Carranza citado em abertura.

Botero 01

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Botero 03

Botero 04

Botero 05

Botero 06

Botero 07

Botero 08

Botero 09

Soneto Insistente

 
La cabeza hermosissima caía

del lado de los sueños; el verano

era um jazmín sin bordes y en su mano

como un pañuelo azul flotaba el día

 
Y su boca de súbito caía

del lado de los besos; el verano

la tenía en la palma de la mano,

hecha de amor: Oh, qué melancolía.

 
A orillas de este amor cruzaba un río;

sobre este amor una palmera era:

agua del tiempo y cielo de poesía.

 
Y el río se llevó todo lo mío:

la mano y el verano y mi palmera

de poesía. Oh, qué melancolía.

in Azul en ti (1944)

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