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Razões familiares ligam-me a Tavira especialmente nas oitenta e duas Primaveras decorridas desde 21 de Março de 1928. É um pouco da história deste período que estas portas contam.

Enquanto acesso à entrada num mundo, qualquer que ele seja, a porta marca um corte entre um antes e um depois.

Entre o eterno e o efémero decorrem os dias de uma vida, no silencioso suceder das estações, qual fluir do rio que corre na minha cidade, ia dizer aldeia como Pessoa, ainda que a ligação do poeta a Tavira seja através de Álvaro de Campos e não do seu mestre Caeiro.

Afinal é em José Régio e no seu livro Música Ligeira que encontro o poema adequado a transmitir esta serenidade primaveril, satisfeita de uma vida vivida sem deliberadamente prejudicar ninguém:

Viver à beira da morte

No gosto de mais um dia,

Nem eu diria

Que tão pouco me conforte.

 

Mas para quem

Não tem senão esse pouco,

Seria louco

Perder o pouco que tem.

 

Gozar o que, sem futuro,

Perdura uns breves instantes,

Não era dantes,

Mas hoje, é o bem que procuro.

 

Mais uma vez brilha o Sol!

E é de prever que à tardinha

Desponte a Lua, vizinha

Do resplendor do arrebol.

 

Talvez que a noite comprida

Traga outra manhã, depois.

Um dia e outro, são dois.

Não são dois dias a vida?

 

Nem eu diria

Que tão pouco me conforte:

Viver à beira da morte

No gosto de mais um dia.