Etiquetas
Nem todos reagimos da mesma forma aos acontecimentos. A exteriorização dos sentimentos que nos assaltam é nuns matéria de reserva, noutros histriónica manifestação. No entanto, para algumas situações tipo há sempre reações que social e psicologicamente se esperam, permitindo aos outros medir a extensão do efeito em nós do que nos atinge, seja na alegria como no desgosto. Para um par apaixonado, forçado à separação, o visível desgosto, se não desespero, tristeza ou desolação, é o que se espera que mostrem.
É nessa expectativa, e no seu não acontecer, que o poema de Heinrich Heine (1797–1856) que escolhi, e a correspondente paráfrase por Gonçalves Crespo (1846-1883) se desenvolvem.
Na primeira quadra os poemas referem a expectativa comum numa separação de apaixonados indivíduos, na segunda quadra os poemas remetem para um tempo posterior à separação o aflorar da sua dor que a separação traz.
O poema de Heinrich Heine é o número XLIX de Lyrisches Intermezzo 1822–1823. A paráfrase de Gonçalves Crespo ao poema desenvolve e explícita o que o curto poema de Heine trazia implícito. No final acrescento uma minha transposição rimada do poema para português, tanto quanto possível fiel ao original, para permitir identificar os acréscimos introduzidos por Gonçalves Crespo na sua paráfrase.
Paráfrase de Gonçalves Crespo a um poema de Heinrich Heine
No momento do adeus sucede que os amantes
Se abraçam, a chorar, com vozes soluçantes.
Força é força partir; a mão prende-se à mão,
E uma infinda tristeza inunda o coração.
Para nós, meu amor, nessa hora de agonia
Não houve o padecer que as almas excrucia;
Foi grave o nosso adeus e frio, e só agora
É que a dor nos subjuga, e a angústia nos devora.
Poema original de Heinrich Heine
Wenn zwei voneinander scheiden,
So geben sie sich die Händ,
Und fangen an zu weinen,
Und seufzen ohne End.
Wir haben nicht geweinet,
Wir seufzten nicht weh und Ach!
Die Tränen und die Seufzer,
Die kamen hintennach.
Poema XLIX de Lyrisches Intermezzo 1822–1823.
Transposição rimada para português do poema de Heinrich Heine
Intermezzo lírico XLIX
Ao separar-se, as mãos
costumam dar-se os amantes
e desfazerem-se em prantos
e suspiros incessantes.
Mas entre nós não chorámos
nem ais nem queixas lançámos
só bem mais tarde chegaram
as lágrimas e o desgosto.
Transposição por Carlos Mendonça Lopes.
Abre o artigo a imagem de uma pintura do italiano Francesco Hayez (1791-1882), O Beijo de 1859.