• Autor
  • O Blog

vicio da poesia

Tag Archives: Paul Verlaine

Internadas — um poema de Paul Verlaine

16 Segunda-feira Jul 2018

Posted by viciodapoesia in Poesia Antiga

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Gustave Courbet, Paul Verlaine

No carrossel das convenções morais, aqui e agora já não é objecto de escândalo o contacto íntimo entre amigas que circunstâncias propícias desencadeia, qual refere este poema de Paul Verlaine (1844-1896), Internadas, até não há muitos anos incluído entre os seus poemas malditos, como a edição portuguesas de onde o transcrevo, evidencia.
A tradução, atrever-me-ia a dizer, mais bela que o original, feita por Luiza Neto Jorge, dá conta, com intensidade, da perturbação erótica que as protagonistas vivem.

O soneto foi inicialmente publicado em Bruxelas em 1867, no livro Amigas, sob o pseudónimo de Pablo Maria de Herlagñes (Ségovie), numa tiragem de 50 exemplares. Condenado à destruição de todos os exemplares pelo Tribunal de Lille, e multado o seu editor, tal não impediu sucessivas edições clandestinas até à sua circulação sem proibições.

 

 

Internadas

Quinze anos uma, a outra uns dezasseis,
Num só quarto dormiam lado a lado.
Era em Setembro, à noite, um ar pesado.
Cor de morango, olhos azuis, tão frágeis.

Despem, como quem livre se deseja,
A veste fina, d’ambar perfumada.
Ergue a mais nova os braços, arqueada,
Enquanto, mãos nos seios, a irmã a beija.

De joelhos já cai, e assim treslouca,
Cola o rosto ao ventre, e sequiosa a boca
Afunda no que é sombra e incandescência;

E a menina recenseia o que sente
Plos débeis dedos, um valsar fremente,
E rosada sorri com inocência.

 

Tradução de Luiza Neto Jorge
in Paul Verlaine, Poemas Malditos, edição em fascículos com doze desenhos de José Rodrigues, Editorial O Oiro do Dia, Porto, 1991.

 

 

Poema original

 

Pensionnaires

L’une avait quinze ans, l’autre en avait seize ;
Toutes deux dormaient dans la même chambre.
C’était par un soir très lourd de septembre
Frêles, des yeux bleus, des rougeurs de fraise.

Chacune a quitté, pour se mettre à l’aise,
La fine chemise au frais parfum d’ambre.
La plus jeune étend les bras, et se cambre,
Et sa soeur, les mains sur ses seins, la baise,

Puis tombe à genoux, puis devient farouche
Et tumultueuse et folle, et sa bouche
Plonge sous l’or blond, dans les ombres grises ;

Et l’enfant, pendant ce temps-là, recense
Sur ses doigts mignons des valses promises,
Et, rose, sourit avec innocence.

 

Transcrito de Paul Verlaine, Poèmes érotiques, Librio, 2006.

 

 

Abre o artigo a imagem de uma pintura gigante (135x200cm) que hoje nos dá as boas-vindas no Petit Palais, museu de belas-artes da cidade de Paris, pintada por Gustave Courbet (1819-1877) em 1866, Le Sommeil.

 

Partilhar:

  • Tweet
  • E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • WhatsApp
  • Pocket
  • Telegram

Gostar disto:

Gosto Carregando...

Nevermore – soneto de Paul Verlaine

30 Segunda-feira Jul 2012

Posted by viciodapoesia in Convite à arte, Poesia Antiga

≈ 1 Comentário

Etiquetas

Paul Verlaine, Toulouse-Lautrec

É a um exercício de reflexão sobre os limites e resultados da tradução de poesia que convido o leitor que simultaneamente leia fluentemente francês.

São três as leituras em português que transcrevo de um famoso soneto de Paul Verlaine (1844-1896), Nevermore.

As opções dos tradutores dividem-se entre a fidelidade verbal ao texto e a captação da ideia numa reconstrução em português.
A polémica é antiga e permanece. Qual delas é a opção legítima? Por mim, apenas o talento poético do tradutor permite criar na nossa língua um poema que pareça ter-lhe sempre pertencido, o que, com rara felicidade, acontece nestas três traduções, embora a tradução de charmant por vibrante, no penúltimo verso, feita por Fernando Pinto do Amaral me pareça discutível.

Outras traduções são ainda possíveis para a infinita nostalgia que se desprende deste Ah! …

– Ah ! les premières fleurs, qu’elles sont parfumées !
Et qu’il bruit avec un murmure charmant
Le premier oui qui sort de lèvres bien-aimées !

Vamos então às traduções. O original encontra-se integralmente no final do artigo.

Nevermore

Doces recordações, que me quereis? O Outono
Fazia o tordo voar num lânguido ar de sono
E, monótono, o Sol lançava do seu trono
Ao bosque desmaiado uma luz de abandono.

Íamos sós os dois, sonhando, o pensamento
E o cabelo a esvoaçar na quimera do vento.
E eis que ela, olhos em mim, num enternecimento,
“Qual foi na vida”, disse,”o teu melhor momento?”

Trinava a doce voz, em vibrações amenas;
Um sorriso discreto eu lhe volvi apenas
E a sua mão beijei, devotamente.

— Ah! as primeiras flor’s, como são perfumadas!
E como se ouve soar, que murmúrio atraente
Tem o primeiro sim nas bocas bem-amadas!

Tradução de Pedro da Silveira

E agora a versão de Herculano de Carvalho

Nevermore

Reviver, reviver, que me queres tu? O Outono
Fazia o tordo abrir as asas pelo céu morno
E, monótono, o Sol lançava um raio em torno
Do bosque amarelando, à brisa, em abandono.

Os dois íamos sós e num sonho absorvente,
Eu e ela, o cabelo e o pensamento ao vento.
De súbito, voltando o olhar de encantamento:
“Qual teu dia melhor?” disse a voz de oiro quente.

A voz doce e sonora, em fresco timbre, angélica,
Um sorriso discreto à pergunta deu réplica,
E beijei sua mão branca devotamente.

— Aí! as primeiras flores e os botões perfumados!
E como soa num murmúrio comovente
O “sim” primeiro, ao vir de lábios bem-amados.

Termino com a versão de Fernando Pinto do Amaral

Nevermore

Ah, lembrança, lembrança, que me queres? O Outono
Fazia voar os tordos plo ar desmaiado
E o sol dardejava um monótono raio
No bosque amarelado onde a nortada ecoa.

A sonhar caminhávamos os dois, a sós,
Ela e eu, pensamento e cabelos ao vento.
De repente, fitou-me em olhar comovente:
“Qual foi o teu mais belo dia?” disse a voz

De oiro vivo, sonora, em fresco timbre angélico.
Um sorriso discreto deu-lhe a minha réplica
E então, como um devoto, beijei-lhe a mão branca.

— Ah! as primeiras flores, como são perfumadas!
E como em nós ressoa o murmúrio vibrante
Desse primeiro sim dos lábios bem-amados!

Nevermore

Souvenir, souvenir, que me veux-tu ? L’automne
Faisait voler la grive à travers l’air atone,
Et le soleil dardait un rayon monotone
Sur le bois jaunissant où la bise détone.

Nous étions seul à seule et marchions en rêvant,
Elle et moi, les cheveux et la pensée au vent.
Soudain, tournant vers moi son regard émouvant
” Quel fut ton plus beau jour? ” fit sa voix d’or vivant,

Sa voix douce et sonore, au frais timbre angélique.
Un sourire discret lui donna la réplique,
Et je baisai sa main blanche, dévotement.

– Ah ! les premières fleurs, qu’elles sont parfumées !
Et qu’il bruit avec un murmure charmant
Le premier oui qui sort de lèvres bien-aimées !

Partilhar:

  • Tweet
  • E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • WhatsApp
  • Pocket
  • Telegram

Gostar disto:

Gosto Carregando...

Visitas ao Blog

  • 2.060.383 hits

Introduza o seu endereço de email para seguir este blog. Receberá notificação de novos artigos por email.

Junte-se a 874 outros subscritores

Página inicial

  • Ir para a Página Inicial

Posts + populares

  • A valsa — poema de Casimiro de Abreu
  • Camões - reflexões poéticas sobre o desconcerto do mundo
  • Eugénio de Andrade — Green god

Artigos Recentes

  • Sonetos atribuíveis ao Infante D. Luís
  • Oh doce noite! Oh cama venturosa!— Anónimo espanhol do siglo de oro
  • Um poema de Salvador Espriu

Arquivos

Categorias

Create a free website or blog at WordPress.com.

  • Seguir A seguir
    • vicio da poesia
    • Junte-se a 874 outros seguidores
    • Already have a WordPress.com account? Log in now.
    • vicio da poesia
    • Personalizar
    • Seguir A seguir
    • Registar
    • Iniciar sessão
    • Denunciar este conteúdo
    • Ver Site no Leitor
    • Manage subscriptions
    • Minimizar esta barra
 

A carregar comentários...
 

    %d bloggers gostam disto: