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Hoje é uma brincadeira erótico-gráfica que trago ao convívio dos leitores: o Sonnet pointu (ou Soneto pontudo como lhe chamei) por Le Sire de Chambley, pseudónimo de Edmond Haraucourt (1856-1941).

O soneto desenvolve-se graficamente em forma de triângulo invertido (base para cima e vértice para baixo). Suspeitando de algum mistério simbólico nessa figura geométrica, dediquei-me à pesquisa de significados por assim dizer esotéricos. E eis que num dicionário de símbolos (ver nota bibliográfica) encontro: “O triângulo com o vértice para cima simboliza o fogo e o sexo masculino; com o vértice para baixo, simboliza a água e o sexo feminino.

Explica-se assim como Picasso (1881-1973) na sua infinita sabedoria, capta tal significado transcendente no desenho que abre o artigo.

Le Sire de Chambley, com enorme subtileza e complexa leitura, põe no poema esse sexo feminino a falar enquanto caminha para o êxtase penetrante que o nome do soneto também evoca. O aguçado do título e a arrumação dos versos em triângulo de vértice para baixo, fazem desta geometria associada ao poema um contributo suplementar na sua decifração. 

Foi essa obra suprema de poesia que certa noite forçadamente desperto, enquanto aguardava do tempo o seu passar, me entretive a trabalhar numa sua versão em português, e que o leitor encontra a seguir. Nada mais vale a pena acrescentar, a não ser, talvez, citar Camões:

Milhor é experimentá-lo que julgá-lo,

Mas julgue-o quem não pode experimentá-lo.

Lusíadas Canto IX, estrofe 83

 

 

 

                            Soneto pontudo

 

  Vem, vem, amante meu!  Abro este meu desejo ao teu;

     Bem vejo como essa tua ânsia aumenta.  Regressa! 

       Sinto-te aí, intenso, duro, fundo dentro de mim…

          Ai!… Sim!… Sim!… Vem, docemente, devagar;

 

             Prolonguemos um pouco este momento…,

                Mantém suave o ritmo desse teu ardor.

                   Ai amor, morro!… Isso,  lentamente,

                      Segue-me neste meu balancear.

 

                          Rápido! Não, mais tempo!

                             Esvaio-me! Ai! Espera,

                                Sim, sim, te adoro…

 

                                   Vá!… vá!… VÁ!

                                      Ainda!… Ai!

                                             Ah !

 

Versão em português por Carlos Mendonça Lopes.

 

 

Poema original:

 

 

                          Sonnet pointu

 

Reviens sur moi!  Je sens ton amour qui se dresse;

 Viens, j’ouvre mon désir au tien, mon jeune amant.

    Là… Tiens… Doucement… Va plus doucement…

      Je sens, tout au fond, ta chair qui me presse.

 

                Rythme bien ton ardente caresse 

                   Au gré de mon balancements, 

                       O mon âme… Lentement, 

                   Prolongeons l’instant d’ivresse.

 

                      Là… Vite! Plus longtemps! 

                            Je fonds ! Attends, 

                               Oui, je t’adore… 

 

                                  Va ! va ! va ! 

                                      Encore. 

                                         Ha !

 

Nota bibliográfica

Soneto original em Le Sire de Chambley, La Legende des Sexes, Poëmes Histeriques, 1882, Impresso em Bruxelas pelo autor.

Jean Chevalier e Alain Gheerbrant, Dicionário dos Símbolos, Editorial Teorema lda, Lisboa, 1994.

 

 

Abre o artigo a imagem de um desenho de Picasso (1881-1973), Fragmento de corpo de mulher (1960), da colecção do Museu Picasso de Paris.