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Não sei até que ponto difere entre si o que hoje as mulheres esperam e admitem dos homens nas suas vidas. Talvez para algumas seja sobretudo o que Anna Piwkowska (1963) a certa altura escreve no poema Co prozynosza mezczyzni (O que os homens trazem) que escolhi traduzir a partir de uma sua versão em inglês:

Queremo-los para o momento de breve intimidade,

quando o destino se concentra como luz na pupila

do olho. …

No resto, a presença dos homens no quotidiano talvez seja empecilho, embaraço; chegará a ser contentamento? 

Que trazem os homens? Pitons, grampos, poemas,

 jogam as camisas desbotadas no chão,

 aquelas que se rasgaram navegando a toda a vela, …

 

 

A exaustiva lista do que os homens introduzem na vida das mulheres enunciada por Anna Piwkowska será parcelar certamente. Outras haverá. A perplexidade sobre as exigências e condicionantes das relações homem/mulher hoje, continuará em mim, sem que uma resposta esclarecedora encontre. Dir-se-á, a mulher enquanto conceito e ser único não existe. Mas até onde no seu relacionamento com o homem ela é sempre singular e única, e não senhora de um comportamento padronizável? Perguntas para continuar a incansável demanda.

 

 

O que os homens trazem

 

Eles trazem na areia das botas, risos e tulipas.

 Os ábacos, réguas, computadores. Títulos

 e ações da bolsa de valores. Mapas, planos 

secretos de aeroportos, bases, basílicas.  Estes mestres de estratégia,

 trazem as bússolas, relógios suíços e laptops,

 agendas em pele e folhas de papel amachucadas,

 cartas de um amigo afogado num

 amor não desejado; estes mestres da utopia trazem

 as suas visões de marchas, desfiles, renderes de guarda.

 Que trazem os homens? Pitons, grampos, poemas,

 jogam as camisas desbotadas no chão,

 aquelas que se rasgaram navegando a toda a vela, bem como aquelas

 que desapareceram em algum lugar alto nas Dolomitas brancas.

 Queremo-los para o momento de breve intimidade,

 quando o destino se concentra como luz na pupila

 do olho.  Quando o ponto escurece, mas o ângulo

 da visão aumenta.  Como navios em docas enferrujadas

 sempre prontos para partir.  A bagagem sempre pronta,

 com uma raquete de ténis, com pontos preciosos

 para os jogos que venceram.  O cartão magnético

 carregado para chamadas, impulsos sob a pele, esse é o seu recurso.

 Navegamos com eles, acreditando em mares sem neblina,

 cigarras, amendoeiras, cotovelos bronzeados pelo sol

 — necessitamos profundamente desse momento até o fim de nossos dias.

 Trazem livros desbotados sobre a alma e a vontade

 com macias capas cinzentas. Gostam de heréticos.

 Apertamo-los nas prateleiras entre os clássicos

 e assim a nossa biblioteca lentamente se completa.

 A nossa vida torna-se completa. Um outono,

 junto com eles, enfiamos capas revestidas a alcatrão 

 e acendemos fogos para finalmente expulsar

 a praga da cidade, enterrá-la para sempre.

 Sobrevivemos-lhes sempre. Luz frágil

 tão facilmente sai das fotografias antigas

 nos olhos, nos lábios — como pó branco, como cal.

 

Tradução do inglês por Carlos Mendonça Lopes 

 

 

Versão em inglês do original polaco:

 

What do men bring 

 

They bring in sand on their boots, laugther and tulips.

Their abacuses, rulers, computers. Bonds 

and shares from the stock exchange. Maps, the secret 

plans of airports, bases, basilicas. This strategy masters, 

they bring their compasses, Swiss watches and laptops,

leather diaries and crumbled sheets of paper, 

letters from a friend who drowned himself 

from unrequired love; these utopia masters bring 

their visions of marches, parades, changes of guard. 

What do men bring? Pitons, crampons, poems, 

they drop their faded shirts to the floor, 

those which got torn under full sail as well as those 

which faded somewhere high in the white Dolomites. 

We want them for the moment of a brief convening,

when fate focuses like light in the pupil

of the eye. When the point darkens, but the angle 

of vision widens. Like ships in rusty docks 

always ready to depart. The baggage always packed, 

with a tennis racket, with precious points 

for matches they had won. The magnetic card 

with call units, impulses under the skin, that’s their asset.

We sail with them believing in fog-free seas,

cicadas, almond trees, elbows tanned by the sun

— we’ll pine for this moment till the end of our days. 

They bring washed-out books on soul and will

in soft, gray covers. They like heretics.

We squeeze them on the shelves among the classics 

and thus our library slowly becomes complete.

Our life becomes complete. One autumn,

together with them, we put on tar-lined coats

and kindle fires to finally expel 

the plague from the city, to bury it for good.

We always survive them. Brittle light 

so easily falls from the old photographs 

on the eyes, the lips — like white dust, like lime.

 

Warsaw, May, 2002

Tradução do polaco para inglês por Elżbieta Wójcik-Leese.

Esta tradução vem incluída em Six Polish Poets, Arc Publications, UK, 2008; e também em Scattering the Dark, An Anthology of Polish Women Poets, White Pine Press, USA, 2015.

Abre o artigo a imagem de uma escultura de George Segal (1924-2000), Couple in Open Doorway 1977.