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Nascemos para ser felizes? A resposta impulsiva é sim. Mas é a felicidade permanente possível? É difícil sequer imaginar semelhante anseio. Fica-nos, no entanto, a possibilidade da busca para o conseguir, pois felizes, e sempre, queremos todos ser.
E é o amor o caminho para essa felicidade? Aí a resposta tem tantas possibilidades quantos os humanos que já viveram e vivem, ou viverão.
A experiência do amor, pessoal e intransmissível, é aflorada pela poesia uma e outra vez, recorrentemente, e nas suas variadas facetas: do amor-paixão ao amor-renúncia, do amor ao outro ao amor aos outros, de filhos a pais e pais a filhos, e por aí fora; encontrando cada um nessas manifestações os momentos de felicidade que fazem a vida compensadora. Mas aquele que, adultos, nos faz vibrar no mais fundo de todas as fibras é o amor consumado no sexo, e desse falam os poemas de Emily Dickinson (1830-1886), que hoje escolhi, num crescendo, do desejo à consumação.
I
Noites Bravias — Noites Bravias!
Estivesse eu contigo
Tais Noites o nosso
Deleite seriam!
Fúteis — os Ventos —
A Coração em Porto —
Inútil a Bússola —
Como o Mapa inútil!
Remando em Éden —
Ah, o Mar!
E eu ancorar — Esta Noite —
Em Ti!
II
E se eu disser que não vou esperar!
Se eu rebentar Portões carnais —
E conseguir chegar — a ti!
Se eu me livrar de ser Mortal —
Onde doer — Dizer não mais —
E em Liberdade mergulhar!
Já não me podem mais — prender!
Masmorras — Armas implorar
Nada me dizem — já — a mim —
Tal como o riso — há — uma hora —
Os Laços — Festas — o que fora —
Ou mesmo quem ontem — morreu!
III
Aprendemos o Todo do Amor —
O Alfabeto — as Palavras —
Um Capítulo — depois o Livro imenso —
E — a Revelação — então fechou-se —
Mas uma Ignorância se fitou
No Olhar de Cada um de Nós —
Mais divina do que é a da Infância —
E cada um para o outro, uma Criança —
Tentando definir e explicar
O que Nenhum de nós — compreendia —
Ah, que é tão larga a Sabedoria —
E a Verdade — têm formas tão diversas!
in Emily Dickinson, Duzentos Poemas, tradução, belíssima, posfácio e organização de Ana Luísa Amaral, Relógio D’Água Editores, Lisboa 2014.
Abre o artigo a imagem de uma pintura de Matisse (1869-1954), A leitora distraída, de 1919, como que embalada nas suas memórias de amor após a leitura de tão empolgante poesia.
Que belo!
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