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Com o sabor e valores de uma época recuada, trago hoje um naco de prosa do esquecido Brito Camacho (1862-1934) a quem Aquilino Ribeiro (1885-1963) dedica um notável estudo no livro De Meca a Freixo de Espada à Cinta (1960).
O Manuel Narciso, maricas dos quatro costados, era ruim trabalhador e detestável pessoa; só para os trabalhos mulherengos tinha jeito e só para os seus amásios tinha demonstrações de estima. Era o pior dos criados, dizia o meu pai; era a melhor das criadas, dizia a minha mãe, e um pouco por esse motivo, mas principalmente por ser irmão da comadre Narcisa, conservou-se na casa até ser velho, muito velho, sempre resmungão, sempre maldizente, escandaloso nos seus actos, que por fim estadeava, provocando a indignação e o nojo. Dizia o compadre Rosa, erudito analfabeto:
– Este diabo é como as sereias, que da cintura para baixo são uma coisa, e da cintura para cima são outra.
Todos os anos, na terça-feira de carnaval, se mascarava de mulher, e era como se a um preso dessem liberdade, abrindo-lhe a porta da cadeia. O compadre João Catarino, quando o via de saias, lenço na cabeça, um xaile pelos ombros, padejando as ancas como as marafonas, não se dispensava de lhe dizer:
– Ó ladrão, tu hoje devias fingir de homem, para te não conhecerem!
Para o curioso leitor deixo uma ligação onde encontra informação sobre Brito Camacho.
http://www.vidaslusofonas.pt/bcamacho.htm
A fotografia é de Henri Cartier-Bresson, de 1932, tirada em Alicante, Espanha