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O que é a vida? O que é o prazer, sem a dourada Afrodite?
– espinafres, sopa de espinafres…
– os espinafres fazem muito bem …
– e o ovo, comprei ovos…
– para pessoas que trabalham…
– e quatro iogurtes…
– não sei como conseguem…
– e leite vigor…
– com filhos e tudo…
– há ali ao lado do talho…
– sempre a correr…
– comprei dois…
– a gente vê-os e não percebe que…
– oitenta e cinco cêntimos…
– talvez seja do tempo…
– o rapaz do talho…
– tenho vindo ao supermercado…
– e os pães de leite…
– encontrei-a e não consigo saber…
– para o jantar…
– foi baratíssimo, e água…
– é uma pena que se enerve…
– pois vamos na segunda e não…
– isto prolonga-se até…
– se calhar é um bom passeio…
– mas vão arranjar os pés a uma senhora…
– espero que o tempo ajude…
– e ficou sem pinga de sangue…
– ela gostava muito…
– eu respeito muito aquela ideia…
– mas como a filha casou…
– não podem votar mulheres…
– então ela virou-se e disse…
– só pode ir a festas com o marido…
– e fez operação a uma vista…
– esteve dois anos desempregado, dois anos…
– e seis meses depois fez outra…
– mas a gasolina está…
– não, ele quis ir-se embora e arranjou casa…
– pensei que mostrava a arrecadação…
– ela fez o que pôde…
– pago quase 20 contos, quase 100 euros…
– o filho disse-lhe “não tens dinheiro para…
– dantes, quando não estava…
– há pessoas que são assim, eu não sei…
– quando ele disse “agora que já…
– é muito diferente…
– ela, concerteza estava a gozar…
– desde que aquele meu primo…
– comecei a andar sempre sozinha…
– e ressonava que era um horror…
– havia a minha irmã, que já faleceu…
– ele sabia que não podia…
– ela dizia-me assim…
– uma pessoa voltando a ver…
– quase que não acreditava…
– mas ela, só que…
– não tem força, está desfeita…
– então não sei muito bem como é…
– e quis que lá ficasse no quarto…
– é como a Maria do Rosário…
– assobiava que sei lá…
– hoje acordei cedo…
– ouvi tocar o telefone…
– para Algés vou só…
– de maneira que me levantei e fui…
– comprei, até foi em Espanha…
– de tal maneira que é impossível…
– e ela disse hoje que sim…
– quarta-feira a oito dias…
– então até amanhã.
– Até amanhã. Ainda bem que conversámos, fiquei tão aliviada!
Assim áspera foi a velhice que o deus impôs.
A este quadro de mesa de café junto a reflexão de Mimnermo, poeta grego do sec VII a. C. Na forma de elegia:
O que é a vida? O que é o prazer, sem a dourada Afrodite?
Que eu morra, quando estas coisas já não me interessarem:
o amor secreto, as suaves ofertas e a cama,
que são flores da juventude sedutoras
para homens e mulheres. Mas quando chega a dolorosa
velhice, que faz até do homem belo um homem repulsivo,
tristes preocupações sempre lhe moem os pensamentos
e já não sente prazer em contemplar a luz do sol,
mas é odiado pelos rapazes e desonrado pelas mulheres.
Assim áspera foi a velhice que o deus impôs.
A tradução é de Frederico Lourenço e vem na preciosa antologia POESIA GREGA de Álcman a Teócrito, publicada por livros Cotovia em 2006.
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Não sem poesia!
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