• Autor
  • O Blog

vicio da poesia

Tag Archives: Canaletto

Veneza em 2 poemas de Aleksandr Blok e pintura de Canaletto

21 Quinta-feira Fev 2013

Posted by viciodapoesia in Crónicas

≈ 2 comentários

Etiquetas

Aleksandr Blok, Canaletto

Canaletto - 1732 a

À imagem iconográfica de Canaletto (1697-1768) com que abre o artigo, dando a ver a Veneza do século XVIII, que em grande parte hoje se conserva, acrescento 2 poemas de Aleksandr Blok (1880-1921), poeta russo, o mais velho daquela geração que sucumbiu ao avançar da revolução soviética para o estalinismo, triturando todos os movimentos artísticos de vanguarda que a revolução permitira e desenvolvera.

Veneza II

Pelas lagunas, frio vento.
Gôndolas – mudas tumbas.
Esta noite, jovem e doente,
Sob a coluna do leão sucumbes.

Na torre, com uma canção de chumbo,
Os gigantes dão a hora noturna.
Na laguna lunar Marcos mergulha
Sua iconóstase soturna.

Nas sombras das galerias dos palácios,
À palidez da lua –  passos.
Salomé, esgueirando-se, passeia
Minha cabeça em sangue nos seus braços.

Tudo dorme – palácios, canais, gente.
Só o passo deslizante da princesa
Só – sobre o peito negro – uma cabeça
Contempla a treva em torno com tristeza.

Veneza III

O barulho da vida já não dura.
A maré de inquietudes se quebranta.
E no veludo negro o vento canta
Minha vida futura.

Talvez despertarei noutro lugar,
Quem sabe nesta terra entristecida,
E algumas vezes hei de suspirar
Pensando em sonho nesta vida?

Mercador, padre, arrais, neto de um doge,
Quem me fará viver? Que criatura
Há de forjar com minha mãe futura
Na noite escura a vida que me foge?

Quem sabe até, ao escutar o canto
Da jovem veneziana, comovido,
O meu futuro pai por entre o encanto
Da canção já me tenha pressentido?

Quem sabe em algum século vindouro
A mim, criança, a sorte me consente
Abrir as pálpebras, tremulamente,
Junto à coluna do leão de ouro?

Mãe, o que canta este áfono instrumento?
Talvez a fantasia já te embale
E me protejas com teu santo xale
Da laguna e do vento?

Não! O que é, o que foi – tudo está vivo!
Fantasias, visões, ideias – tudo!
A onda do oceano recidivo
As despeja na noite de veludo!

Traduções de Augusto de Campos, in poesia da recusa, Perspectiva, São Paulo, 2006.

Apenas a biografia e a peculiar disposição do poeta Aleksandr Blok explica esta atmosfera de morte que percorre os seus poemas evocando Veneza, os quais integram os Versos Italianos de 1909.

Provavelmente a cidade que ele conheceu não foi a Veneza que em meados dos anos 70 conheci e me apaixonou como a mais bela das cidades, onde a ausência de ruído automóvel e o som dos passos no empedrado de calçadas e pontes fazia o mundo parecer de uma magia fora do meu tempo.

Hoje, a avalanche turística permanente fez desaparecer grande parte dessa magia, mas há um encanto que permanece e faz desejar voltar a Veneza, sempre.

Termino com mais 3 vistas de Veneza pelo pincel mágico de Canaletto.

Canaletto - 1728

Canaletto - 1732 b

Canaletto - 1732

Partilhar:

  • Tweet
  • Carregue aqui para enviar por email a um amigo (Abre numa nova janela) E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • Clique para partilhar no WhatsApp (Abre numa nova janela) WhatsApp
  • Pocket
  • Clique para partilhar no Telegram (Abre numa nova janela) Telegram
Gosto Carregando...

Veneza de Alfred de Musset

22 Domingo Jul 2012

Posted by viciodapoesia in Convite à arte, Poesia Antiga

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Alfred de Musset, Canaletto

Veneza é paixão de quem a visita, e na poesia abundam as obras com Veneza como fundo ou pretexto, sendo talvez a maior, o conjunto de epigramas venezianos de Goethe. Acrescem outras poesias espalhados pela obra de poetas das mais variadas épocas. Para hoje escolhi um poema de Alfred de Musset (1810-1857), cuja poesia é nos nossos dias pouco conhecida em Portugal, que eu saiba.

Este Venise (Veneza) é uma poesia dos vinte anos incluída no seu primeiro livro, Contes d’Espagne et d’Italie. Contém este livro poesias, plenas de verve, de um jovem a quem os prazeres levaram a escrever a famosa obra licenciosa Gamiani, ou duas noites de excessos. A sua vida aparece contida, ao que se diz, em toda a obra, da qual La Confession d’un Enfant du Siècle permanece um documento notável sobre a juventude culta da primeira metade do século XIX em França. Pela sua poesia, de uma deliciosa musicalidade, foi chamado “o poeta da juventude”.

Para a biografia fica a relação escandalosa com George Sand e depois da rotura, com a Malibran, diva cara aos melómanos, para quem várias obras-primas da ópera foram compostas, e a quem há poucos anos Cecília Bartoli dedicou um espectacular disco, concerto dvd e museu itinerante.

Veneza

Em Veneza a vermelha,
Nenhum barco aparelha;
Nem pescador, no mar,
Se vê pescar.

Só, sobre o cais sentado,
Vela o leão do Estado,
Que ao horizonte adianta
A brônzea planta.

Ao seu redor, qual bando
De cisnes repousando,
Alinham, numerosas,
Naves airosas.

Dormem na água, que fuma,
E cruzam sob a bruma,
Em leves convulsões,
Os pavilhões.

A Lua, que perpassa,
Desmaia a fronte baça,
De uma nuvem ‘strelada
Meio velada …

— Como de Santa Cruz
A madre o seu capuz,
Sobre o rosto descai,
Que lho retrai.

E os palácios vetustos,
Os pórticos augustos,
Dos grande as escadas
Ornamentadas,

Mais as ruas, as pontes,
As estatuas e as fontes,
E o golfo, que o vento
Faz turbulento,

São mudos! … Só os guardas,
De longas alabardas,
Vão e vêm nos portais
Dos arsenais.

— Ah! quanta bela, agora,
Moço gentil que adora
Espera na janela
Que venha vê-la …

Outras ao espelho, entanto,
A mascarilha e o manto,
Para o baile a que vão,
Ajeitarão.

No leito perfumado,
O amante idolatrado
Vanina abraça ainda
Dormindo, linda.

Narciso, a louca altiva,
Na gôndola, lasciva,
Aturde-se na orgia
Até ser dia.

Mas quem, na Italia, um pouco,
Oh Céus! não tem de louco?
Quem não dá ao amor
Da vida a flor?

No palácio do doge,
Conte a hora que foge
O relógio cansado,
Em tom magoado …

Deixemo-lo, formosa!
E em tua boca sequiosa
Contemos beijos dados …
Ou perdoados.

Contemos teus encantos
E mais os doces prantos
Das horas de langor
Do nosso amor!

Venise (original em francês)

Dans Venise la rouge,
Pas un bateau qui bouge,
Pas un pêcheur dans l’eau,
Pas un falot.

Seul, assis à la grève,
Le grand lion soulève,
Sur l’horizon serein,
Son pied d’airain.

Autour de lui, par groupes,
Navires et chaloupes,
Pareils à des hérons
Couchés en ronds,

Dorment sur l’eau qui fume,
Et croisent dans la brume,
En légers tourbillons,
Leurs pavillons.

La lune qui s’efface
Couvre son front qui passe
D’un nuage étoilé
Demi-voilé.

Ainsi, la dame abbesse
De Sainte-Croix rabaisse
Sa cape aux larges plis
Sur son surplis.

Et les palais antiques,
Et les graves portiques,
Et les blancs escaliers
Des chevaliers,

Et les ponts, et les rues,
Et les mornes statues,
Et le golfe mouvant
Qui tremble au vent,

Tout se tait, fors les gardes
Aux longues hallebardes,
Qui veillent aux créneaux
Des arsenaux.

Ah ! maintenant plus d’une
Attend, au clair de lune,
Quelque jeune muguet,
L’oreille au guet.

Pour le bal qu’on prépare,
Plus d’une qui se pare,
Met devant son miroir
Le masque noir.

Sur sa couche embaumée,
La Vanina pâmée
Presse encor son amant,
En s’endormant ;

Et Narcissa, la folle,
Au fond de sa gondole,
S’oublie en un festin
Jusqu’au matin.

Et qui, dans l’Italie,
N’a son grain de folie ?
Qui ne garde aux amours
Ses plus beaux jours ?

Laissons la vieille horloge,
Au palais du vieux doge,
Lui compter de ses nuits
Les longs ennuis.

Comptons plutôt, ma belle,
Sur ta bouche rebelle
Tant de baisers donnés…
Ou pardonnés.

Comptons plutôt tes charmes,
Comptons les douces larmes,
Qu’à nos yeux a coûté
La volupté !

Acompanham o artigo três pinturas de Bernardo Canal dito Canaletto (1697-1768), veneziano que pintou a cidade como nenhum outro.

A tradução do poema é de Pedro da Silveira e encontra-se no livro Mesa de Amigos, Angra do Heroísmo, 1986.

Partilhar:

  • Tweet
  • Carregue aqui para enviar por email a um amigo (Abre numa nova janela) E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • Clique para partilhar no WhatsApp (Abre numa nova janela) WhatsApp
  • Pocket
  • Clique para partilhar no Telegram (Abre numa nova janela) Telegram
Gosto Carregando...

Visitas ao Blog

  • 2.348.940 hits

Introduza o seu endereço de email para seguir este blog. Receberá notificação de novos artigos por email.

Junte-se a 894 outros subscritores

Página inicial

  • Ir para a Página Inicial

Posts + populares

  • As três Graças - escultura de Canova e um poema de Rufino
  • Pelo Natal com poemas de Miguel Torga
  • Fernando Pessoa - Carta da Corcunda para o Serralheiro lida por Maria do Céu Guerra

Artigos Recentes

  • Sonetos atribuíveis ao Infante D. Luís
  • Oh doce noite! Oh cama venturosa!— Anónimo espanhol do siglo de oro
  • Um poema de Salvador Espriu

Arquivos

Categorias

Site no WordPress.com.

Privacy & Cookies: This site uses cookies. By continuing to use this website, you agree to their use.
To find out more, including how to control cookies, see here: Cookie Policy
  • Subscrever Subscrito
    • vicio da poesia
    • Junte-se a 894 outros subscritores
    • Already have a WordPress.com account? Log in now.
    • vicio da poesia
    • Subscrever Subscrito
    • Registar
    • Iniciar sessão
    • Denunciar este conteúdo
    • Ver Site no Leitor
    • Manage subscriptions
    • Minimizar esta barra
 

A carregar comentários...
 

    %d