A minha visão de paraíso é frequentemente uma noite quente, frente ao mar calmo, sob um céu negro onde estrelas faíscam, e o mar murmura a melopeia da eternidade.
Neste cenário a tecnologia tem feito intromissão, proporcionando o casamento feliz das noites quentes com o cinema da minha afeição.
Aproveitei para ver alguns filmes antigos que por uma razão ou outra o desejo de rever foi sendo adiado ao longo do tempo.
Entrada a noite e sossegado o ambiente, sento-me frente ao mar, tablet na mão, carrego no botão e… Silêncio, o filme vai começar!

 

Entre As férias do Sr. Hulot de Jacques Tati (1953) e Ladrão de Casaca (To Catch a Thief -1956) de Alfred Hitchcock, deliciei-me com Sorrisos de uma noite de verão de Ingmar Bergman (1955) e Os homens preferem as louras de Howard Hawks (1953).


A  transbordante ternura pelas pessoas que os filmes de Tati exalam, no seu permanente enlevo com os detalhes de um quotidiano urbano que evolui ao longo dos seus filmes, são um bálsamo para a alma.


Já nos filmes de Hitchcock é o prazer de seguir a mestria de fazer a câmara falar ao levar-nos pelos labirintos das emoções da história, o que me faz voltar a eles uma e outra vez.


Atrai-me nos filmes de Ingmar Bergman a celebração da vida perante a fragilidade das relações humanas. Por isso, e para referir os mais emblemáticos, Sorrisos de uma noite de verão encanta-me, Uma lição de amor comove-me, e o Sétimo selo lembra-me quanto viver é o permanente diálogo com a morte, nossa, e dos outros em nós. A capacidade da ficção para nos fazer sentir realidades e experiências afastadas do nosso presente ou passado é o motor que me faz ir à sua procura.


Hawks foi o cineasta que filmou a amizade como ninguém. E se em Rio Bravo ( que irei rever brevemente) a fidelidade entre amigos se estende à coragem de em seu nome enfrentar a possibilidade da morte, em Os homens preferem as louras essa amizade plasma-se na inenarrável cena da dança de Jane Russell na sala do tribunal, perto do final do filme, com o propósito de evitar que a amiga Lorelay (Marilyn Monroe) seja julgada pelo roubo de uma tiara.

 

Na sua diversidade, têm estes filmes em comum a sua proximidade temporal (primeira metade dos anos 50 do século. XX) e o devolverem-nos uma certa Europa com o seu modo de vida hoje definitivamente perdido. Dão-nos conta de um mundo que existia quando nasci e não cheguei a conhecer. A realidade que a minha memória recorda é a dos anos 60, mas ao ver estes filmes, o ambiente social e cultural que lhes subjaz dá conta de uma serenidade no viver que só nos pode fazer nostálgicos quando mergulhados no frenesi alucinante dos nossos dias.

 

Outros filmes virão, que as férias apenas começaram. Com este breve registo venho apenas lembrar alguns velhos filmes que nos fazem mais novos a cada visualização.

 

 

Abre o artigo a recriação recente desta imagem nostálgica do filme de Jacques Tati, As férias do Sr. Hulot, pelo designer belga David Merveille.