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A vida faz-se muito de desencontros, momentos falhados, ou fugazes olhares de felicidade entrevista. Afinal, o sonho a escapar-se no bulício dos dias.
Uma dessas perdas conta-a Camilo Castelo-Branco (1825-1895) no poema Perdida! escrito em 1850. Nele encontramos a flor, metáfora da mulher e sua beleza, no registo caro aos poetas ultra-românticos que Camilo, nos seus inícios de escritor também foi.
Neste poema estamos nos antípodas das imagens de flores e sentimentalidade trabalhadas pela mesma época por Maria Browne (1797-1861), e que no artigo anterior mostrei.
Será contemporâneo destes poemas o encontro (com laivos de paixão?) ocorrido entre Camilo e Maria Browne que levou ao duelo do escritor com o filho desta, e que relatos da época referem com motivações obscuras, sendo esse relacionamento insinuado.
Registado o pormenor biográfico, passemos ao poema onde o poeta faz gala da sua fogosidade viril e do imparável desejo de descobrir que assalta a juventude de todas as épocas ( Camilo tinha 25 anos), aqui registado na irrefreável cavalgada para o desconhecido, mais empolgante que a permanência na envolvente que se conhece.
Perdida!
Veloz, qual flecha impelida
O meu cavalo corria…
Eu tinha a febre da raiva,
Abrasava-me a agonia,
E o cavalo generoso
O meu ódio concebia.
Os precipícios transpunha
Sem as rédeas sofrear!
Longe, ao longe eu ansiava
Este horizonte alargar;
Procurava mundos novos,
Faltava-me ali o ar.
E, de relance, deviso
Linda flor em ermo Val,
Mal aberta, e aljofrada
Pelo orvalho matinal,
Reacendendo solitária
Seu perfume virginal.
Nenhum homem lhe tocara,
Nem talvez a vira ali!
Tive orgulho de encontrá-la,
Que outra mais bela não vi.
Mas o ímpeto indomável
Do cavalo não venci.
E perdi-a! Não me lembro
Onde vi tão linda flor!
Sei que lá me fica a alma
Como um feudo pago à dor.
Outros lábios viral dar-lhe
Férvido beijo d’amor.
1850
in Ao Anoitecer da Vida, livro de poemas publicado pela primeira vez em 1873.
Abre o artigo a imagem de uma pintura de Edgar Degas (1834-1917), O Jokey.
Calha-me bem, o poema de Camilo. Que de relance divisei minha linda flor, surgida do nada no meu cavalgar mecânica cavalgadura. Fui mais feliz que Camilo: Não a perdi…
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Gosto muito do Camilo Castelo Branco. E esse poema é um dos meus preferidos
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Amoooo, seu blog!! Você escrever muito bem sabia?, Estou sempre acompanhando de forma anônima, conte sempre com a minha participação aqui tá, Deixe-me apresentar, sou o Gustavo tenho 13 anos e amo escrever poemas, por favor de uma conferida eu sei q vai gostar:https://tvweb2016.wordpress.com/2017/04/22/poema-o-lar/
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Gustavo, obrigado pelo seu caloroso comentário. Não imagina como fico feliz por saber que jovens como você gostam do que escrevo e escolho para o blog.
Li o seu poema, gostei da ideia e da forma de a exprimir, poupada na descrição e procurando transmitir a essência da dúvida.
Permite-me uma sugestão? Continue a escrever poesia e trabalhe para fugir à facilidade da rima em ar e semelhante. A sua sonoridade é apelativa à primeira leitura, mas distrai da ideia do poema. Procure antes a musicalidade no poema, se é isso que quer, no ritmo e na cesura do verso.
Até breve.
Carlos Mendonça Lopes
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Republicou isto em Leveza e Esperança and commented:
Camilo Castelo Branco, lido em todos os países lusófonos, mas ´cassado´ do CV de escolas do Brasil.
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