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Memória e história condensam-se no poema de Friedrich Hölderlin (1770-1843) que a seguir transcrevo,  A Grécia. [segundo esboço], transcendendo o contexto específico da sua escrita na obra do poeta, a Grécia clássica e a sua herança, e levando-nos a reflexão para as determinantes da existência:


Quando, porém, em excesso
A desmesura aspira à morte,
Adormece o divino, e a fidelidade de Deus.
A sensatez ausenta-se.

 

Lemos algo da pesada atmosfera política dos nossos dias nestes versos. Vivemos de novo um tempo especialmente exigente no assegurar as conquistas de civilização do nosso mundo, de que a herança da Grécia clássica é parte maior. E todos os dias constatamos que o adquirido é precário e sem garantia de ser encontrado ao acordar no dia seguinte. Vale no entanto a pena ter presente que

… quando a Terra, evocando devastações, tentações de santos,
Segue as grandes leis sagradas, a concórdia
E a ternura e o céu inteiro ressoam então
Revelando-se no
Canto das nuvens. …

 

 

 

Segue o poema integralmente, em admirável tradução de João Barrento:

 

 

A Grécia.
[segundo esboço]

 

Muitas são as lembranças.
E quando a Terra, evocando devastações, tentações de santos,
Segue as grandes leis sagradas, a concórdia
E a ternura e o céu inteiro ressoam então
Revelando-se no
Canto das nuvens. Pois viva
É sempre a natureza.
Quando, porém, em excesso
A desmesura aspira à morte,
Adormece o divino, e a fidelidade de Deus.
A sensatez ausenta-se.
Mas, tal como a dança é parte da boda,
Também ao mais humilde se pode juntar
Um grande começo.
E dia a dia, para nossa maravilha,
Deus se mostra com novas vestes.
E Seu rosto se furta ao conhecer
E ar e tempo escondem
O Terrível, quando alguém em excesso
O ama, com preces ou
A alma.

 

in Lógica Poética, Friedrich Hölderlin, organização Bruno C. Duarte, Edições Vendaval, Lisboa, 2011.

 

Abre o artigo a imagem de uma pintura a aguarela de Gerhard Richter ( 1932) pintada em 1988.