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Profunda, deslumbrante na simplicidade da sua linguagem, com uma ironia onde a inteligência brilha, assim leio a poesia de Wisława Szymborska (1923-2012), de quem hoje transcrevo, para iniciar poeticamente 2014, esta reflexão sobre o amor feliz que não faz assunto de poesia.
Amor feliz
Amor feliz. Será normal,
será sério, será útil? —
que tem o mundo a ver com duas pessoas
que não vêem o mundo?
Erguidos ao céu sem mérito nenhum,
os melhores entre milhões e convencidos
que assim tinha que ser — a premiar o quê? Nada;
de algum ponto cai a luz —
e porquê logo sobre estes e não outros?
Ofenderá isto a justiça? Sim.
Perturbará os princípios estabelecidos com cuidado?
Derrubará do seu púlpito a moral? Perturba e derruba.
Olhem-me bem estes felizardos:
se ao menos se mascarassem um pouquinho,
fingissem melancolia dando assim algum ânimo aos amigos!
Ouçam bem como se riem — é um insulto.
A linguagem que usam — entendivel, pelos vistos.
E aquelas cerimónias, etiquetas,
obrigações rebuscadas um para o outro —
parece mesmo um acordo nas costas da humanidade.
É difícil até de prever no que daria
se um tal exemplo pudesse ser seguido.
Com que é que poderiam contar as religiões, a poesia,
de que nos recordaríamos, de que desistiríamos,
quem quereria pertencer ao círculo?
Amor feliz. Assim terá que ser?
Tacto e bom senso mandam omiti-lo
como a um escândalo nas altas esferas da Existência.
Tradução de Júlio Sousa Gomes. Transcrito de Paisagem com Grão de Areia, edição Relógio d’Água, Lisboa, Junho de 1998.
Eu estou bastante impressionado com a qualidade dos textos selecionados; são magníficos. Eu convido você, amigo português, a também publicar – se lhe faz gosto – poemas de Ferreira Gullar, que quiçá está entre os maiores poetas brasileiros de nossa história.
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Obrigado pelo seu comentário. Já encontra no blog poesia de Fernando Gullar, ainda que não os seus poemas mais conhecidos. Esses, abundam na net. Deixo a seguir o link para o artigo do blog com poemas de Gullar. Até breve.
https://viciodapoesia.wordpress.com/2011/12/18/um-sorriso-trazido-por-ferreira-gullart-1930-e-mais-poesia-erotica/
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