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Pelos Cantos de Leopardi (1798-1837) passa uma serena meditação sobre o que na vida nos importa, do nascimento à morte; a palpitação do amor e o fogo extinto; os sinais que da história nos ficam e a atenção ao contemporâneo que foi seu. Tudo numa poesia onde o inefável frequentemente surge transmitindo uma dimensão atemporal ao seu verso.
Estreio esta poesia no blog com o poema A Se Stesso, atípica reflexão juvenil, tinha o poeta 37 anos, sobre a finitude e o sentido da existência, em duas traduções em português: uma por Jorge de Sena, a outra por Albano Martins.
A Si Mesmo
Repousa para sempre,
exausto coração. Morto é o engano extremo
que eu supusera eterno. É morto. E sinto
que em nós de enganos caros
a mais da esp’rança, o desejar é extinto.
Repousa. Já bastante
hás palpitado. Coisa alguma vale
o teu bater, nem de saudade é digna
a terra. Tédio amargo
a vida, e nada mais; e lama é o mundo.
Quieto, pois. Desperta
por uma última vez. À raça humana o fado
não deu mais que o morrer. Ora despreza
a natureza, o triste
brutal poder que contra nós impera.
e o infinito vácuo do que existe.
Tradução de Jorge de Sena
in Poesia de 26 Séculos, Antologia, tradução, prefácio e notas de Jorge de Sena, Fora do Texto, Coimbra, 1993.
A Si Próprio
Repousarás agora para sempre,
Ó meu cansado coração. Está morta a suprema
Ilusão, que julguei eterna. Morta. Bem sinto
Que das minhas caras ilusões
Não a esperança, mas o desejo é extinto.
Repousa para sempre. Demasiado
Palpitaste. De nada valem
Teus movimentos, nem de suspiros é digna
A terra. Amargor e tédio
A vida, nada mais; o mundo é lama.
Sossega, enfim. Desespera
Pela última vez. À nossa espécie o destino
Mais não deu que o morrer. Despreza-te, a partir de agora,
A ti, à natureza, ao mau
Poder, que, oculto, para nosso comum dano governa,
E à infinita vaidade de tudo.
Tradução de Albano Martins
in Giacomo Leopardi, Cantos, Apresentação, seleção, tradução e notas de Albano Martins, Vega, Gabinete de Edições, Lisboa, s/d.
A Se Stesso
Or poserai per sempre,
Stanco mio cor. Perì l’inganno estremo,
Ch’eterno io mi credei. Perì. Ben sento,
In noi di cari inganni,
Non che la speme, il desiderio è spento.
Posa per sempre. Assai
Palpitasti. Non val cosa nessuna
I moti tuoi, né di sospiri è degna
La terra. Amaro e noia
La vita, altro mai nulla; e fango è il mondo.
T’acqueta omai. Dispera
L’ultima volta. Al gener nostro il fato
Non donò che il morire. Omai disprezza
Te, la natura, il brutto
Poter che, ascoso, a comun danno impera,
E l’infinita vanità del tutto.
(1835)
Transcrito de Leopardi, Canti, con uno scritto di Giuseppe Ungaretti, Arnaldo Mondadori Editore S.p.A., Milão, 1987.
Abre o artigo a imagem de uma pintura de Francis Bacon (1909-1992), Estudo para um retrato de 1991.
Republicou isto em Literatura Goyaz and commented:
Do melhor da Poesia Italiana – Giacomo Leopardi!
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