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Numa volta do caminho no regresso a casa  deixo para trás o ruído de luzes e faróis e súbito surge pela frente, plácida, esplendorosa,  a lua, cheia.

Perco a urgência de chegar e de mansinho deslizo por aquele caminho iluminado saboreando o azul cerúleo do céu e a língua de prata sobre o rio. Sonho com passeios mão-na-mão e beijos da amada à beira-mar. É o fragmento 34 de Safo que a memória me trás:

 

Lua Cheia

As estrelas ao redor

da lua bela

longe o brilho escondem

quando,

plena de fulgor,

mais ela

se entorna

cheia

pela terra.

 

Escrito há talvez mais de 2600 anos, mostra bem como o sortilégio perene da  natureza torna homens e mulheres iguais para além do tempo e do espaço.

Esta versão do poema grego é de Pedro Alvim, e foi publicada com outros fragmentos da poetisa pela Editora Vega em 1991.


São várias em português as versões deste poema. Deixo aqui  outras 3 versões de desigual resultado na transmissão da emoção do original grego.


Em redor da formosa

lua, as estrelas

de novo escondem

seu rosto brilhante

quando ela, cheia,

brilha sobre a terra

em todo o seu fulgor.


Versão de Albano Martins publicada em 1986  pela Imprensa Nacional – Casa da Moeda em O essencial de ALCEU E SAFO.


A Lua

As estrelas, em volta da formosa Lua,

de novo ocultam a sua vista esplendente,

quando a Lua cheia brilha mais, argêntea,

sobre toda a terra.


Tradução de Maria Helena da Rocha Pereira publicada em Hélada – Antologia da Cultura Grega, Edições ASA, 8ªedição 2003.


E agora, talvez a mais bela versão em português deste fragmento. A versão de Frederico Lourenço, publicada por Livros Cotovia em 2006, e incluída na sua antologia Poesia Grega.


A lua

Os astros em torno da bela lua

escondem seu aspecto cintilante

quando na sua plenitude ela ilumina

a terra.


Tendo vivido em Lesbos, ilha grega do mar Egeu, nos finais do século VII a. C., gosto de pensar que uma paisagem como a da fotografia desta crónica terá estado na origem deste belo fragmento.


Da poesia de Safo restam hoje apenas fragmentos, e tal com na escultura grega admiramos a sua beleza mutilada, nesta poesia saboreamos com comoção e embevecimento os restos que nos embalam a imaginação.

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