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N’aquelle “pic-nic” de burguezas,
Houve uma coisa simplemente bella,
E que, sem ter historia nem grandezas,
Em todo o caso dava uma aguarella.
Foi quando tu, descendo do burrico,
Foste colher, sem imposturas tolas,
A um granzoal azul de grão de bico
Um ramalhete rubro de papoulas.
Pouco depois, em cima d’uns penhascos,
Nós acampámos, inda o sol se via;
E houve talhadas de melão, damascos,
E pão de ló molhado em malvasia.
Mas, todo purpuro, a sahir da renda
Dos teus dois seios como duas rolas,
Era o supremo encanto da merenda
O ramalhete rubro das papoulas!
Conservei a ortografia da 1ªedição
Retratos de mulher atravessam toda a curta obra de Cesário Verde, sempre belíssimos pela penetração psicológica de que dão conta, surpreendida esta num gesto, num estar, num vestir, em suma, nos pequenos nadas da vida que fazem grande a sua poesia.
Mas não é o retrato de mulher que me liga ao poema.
Estes quatro quartetos trazem-me de cada vez que os leio, ou recordo, a imagem perfeita da força da vida, vivida na sua essência através das coisas simples do mundo, exactamente sem historia nem grandezas, mas preenchida de momentos de plenitude absoluta como este “pic-nic” ao pôr-do-sol, a comer fruta.