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Negócios e poesia são certamente realidades que improvavelmente se cruzam, a não ser fazer de negócios assunto de poesia, cometimento que de forma brilhante Vasco Costa Marques (1928-2006) consegue no poema que hoje transcrevo.
Não só a dificuldade do assunto é de monta como a forma escolhida, o soneto, no rigor da sua construção é um obstáculo acrescido ao sucesso da empresa. E assim, a urgência de um negócio nas suas múltiplas vertentes fica plasmado num primoroso soneto de inultrapassável ironia.
De 3 Poemas de “Importação-Exportação”
Note que o tempo foge-nos dos dedos,
veloz como um foguete supersónico.
Não podemos perder os barcos gregos:
mantenham-se em contacto telefónico.
É de prever a curva do negócio:
conservas para Goa no embarque.
Sonde-me o Ministério e o Consórcio
New Manufactur’s of Lorenzo Marques.
Prometa o que quiser, mas verbalmente.
Sinto que está a ser ultrapassado
e isso, meu caro, é a morte de um gerente.
Temos de ir mais depressa, mais depressa!
Veja se a Union Bank envia o delegado,
e ature-me esses tipos da Imprensa.
do livro O mundo possível, (1961)
Pela data do poema e a referência a Goa suponho que o pretexto directo do soneto foi a crise da chamada Índia Portuguesa, com a invasão iminente pela União Indiana dos territórios ainda ocupados por Portugal no sub-continente indiano. É esta a urgência reflectida no assunto do poema e de que a imprensa não devia dar notícia. Podia ser qualquer outro o quadro histórico. O poema não perde um grão do seu brilho formal retirado deste contexto de realidade.
Nota bibliográfica
Poema transcrito de Maria Alberta Menéres e E. M. de Melo e Castro, antologia da novíssima poesia portuguesa, 2.ª edição revista, actualizada e com uma nova introdução, Livraria Morais Editora, 1961.
Abre o artigo a imagem de um poster de Willem Frederick Ten Brock de 1936.