• Autor
  • O Blog

vicio da poesia

Tag Archives: Miguel de Unamuno

Portugal – soneto de Miguel de Unamuno e homenagem de Torga ao filósofo-poeta

14 Sexta-feira Mar 2014

Posted by viciodapoesia in Poetas e Poemas

≈ Deixe um comentário

Etiquetas

Miguel de Unamuno, Miguel Torga

Jean Froissart - cerco lisboa em 1384Lermo-nos pelo olhar dos outros, quando inteligentes e despreconceituados, ajuda-nos a perspectivar uma história e um sentir colectivo que frequentemente parece perdido nestes conturbados tempos de crise.

É sabido o conhecimento, o carinho, e admiração de Don Miguel de Unamuno (1864-1936) por Portugal, pela cultura portuguesa, por terras e gentes de Portugal; o que a correspondência conhecida, trocada com grandes vultos da cultura portuguesa, e o livro Por Tierras de Portugal y de España evidenciam.

Transcrevo hoje o poema PORTUGAL dando na sua forma condensada em soneto, algo do que nos define enquanto povo: a geografia que nos desenhou e a história que deixou para as mulheres a guarda do que ficou, quais leoas de olhar desconfiado protegendo as crias, e a ansiedade expectante do que o futuro trará. Partem os homens na busca de melhor vida. Regressarão?

 

Não sei se será este PORTUGAL o poema a que Unamuno se refere em carta a Manuel Laranjeira datada de Salamanca, 08-10-1908, onde diz a certa altura:

“Voltei outra vez a um poema que comecei há três anos no Porto e a que chamo Portugal. Essa sua terra atrai-me e atrai-me sobretudo por causa das suas desgraças e prostração.“

 

PORTUGAL

 

Do atlântico mar na praia areosa

uma matrona descalça e desgrenhada

senta-se ao pé de uma serra coroada

por triste pinheiral. Nos joelhos pousa

 

os cotovelos e nas mãos a ansiosa

face, e olhos de leoa desconfiada

crava no poente; o mar dá a toada

trágica, de altos feitos sonorosa.

 

Fala de vastas terras e de azares

enquanto ela, seus pés nessas espumas

banhando, sonha no fatal império

 

que se sumiu nos tenebrosos mares,

e olha como entre agoureiras brumas

se ergue D. Sebastião, rei do mistério.

 

Salamanca, 28 IX 1910

Tradução de José Bento in Miguel de Unamuno, Antologia Poética, Assírio & Alvim, Lisboa, 2003.

 

Termino com o poema-homenagem que Miguel Torga (1907-1995) escreveu para Unamuno.

 

Unamuno

 

D. Miguel…

Fazia pombas brancas de papel

Que voavam da Ibéria ao fim do mundo…

Unamuno Terceiro!

(Foi o Cid o primeiro,

D. Quixote o segundo.)

 

Amante duma outra Dulcineia,

Ilusória, também

(Pátria, mãe,

Ideia

E namorada),

Era seu defensor quando ninguém

Lhe defendia a honra ameaçada!

 

Chamado pelo aceno da miragem,

Deixava o Escorial onde vivia,

E subia, subia,

A requestar na carne da paisagem

A alma que, zeloso, protegia.

 

Depois, correspondido,

Voltava à cela desse nosso lar

Por Filipe Segundo construído

Com granito da fé peninsular.

 

E falava com Deus em castelhano.

Contava-lhe a patética agonia

Dum espírito católico, romano,

Dentro dum corpo quente de heresia.

 

Até que a madrugada o acordava

Da noite tumular.

E lá ia de novo o cavaleiro andante

Desafiar

Cada torvo gigante

Que impedia o delírio de passar.

 

Unamuno Terceiro!

Morreu louco.

O seu amor, por ser demais, foi pouco

Para rasgar o ventre da Donzela.

D. Miguel…

Fazia pombas brancas de papel,

E guardava a mais pura na lapela.

 

Publicado em Poemas Ibéricos (1ªedição em 1965).

 

Abre o artigo uma iluminura medieval figurando o cerco castelhano a Lisboa durante a crise de 1383-1385 — “Se Lisboa se não opusera todo o reino se perdera, D. João I”.

Termino com outra iluminura, desta vez pretendendo ilustrar a batalha de Aljubarrota onde Castela foi definitivamente derrotada, e figurou como heroína a célebre Padeira de Aljubarrota.

Batalha Aljubarrota

Partilhar:

  • Tweet
  • Carregue aqui para enviar por email a um amigo (Abre numa nova janela) E-mail
  • Partilhar no Tumblr
  • Clique para partilhar no WhatsApp (Abre numa nova janela) WhatsApp
  • Pocket
  • Clique para partilhar no Telegram (Abre numa nova janela) Telegram
Gosto Carregando...

Visitas ao Blog

  • 2.348.906 hits

Introduza o seu endereço de email para seguir este blog. Receberá notificação de novos artigos por email.

Junte-se a 894 outros subscritores

Página inicial

  • Ir para a Página Inicial

Posts + populares

  • Pelo Natal com poemas de Miguel Torga
  • As três Graças - escultura de Canova e um poema de Rufino
  • Fernando Pessoa - Carta da Corcunda para o Serralheiro lida por Maria do Céu Guerra

Artigos Recentes

  • Sonetos atribuíveis ao Infante D. Luís
  • Oh doce noite! Oh cama venturosa!— Anónimo espanhol do siglo de oro
  • Um poema de Salvador Espriu

Arquivos

Categorias

Create a free website or blog at WordPress.com.

Privacy & Cookies: This site uses cookies. By continuing to use this website, you agree to their use.
To find out more, including how to control cookies, see here: Cookie Policy
  • Subscrever Subscrito
    • vicio da poesia
    • Junte-se a 894 outros subscritores
    • Already have a WordPress.com account? Log in now.
    • vicio da poesia
    • Subscrever Subscrito
    • Registar
    • Iniciar sessão
    • Denunciar este conteúdo
    • Ver Site no Leitor
    • Manage subscriptions
    • Minimizar esta barra
 

A carregar comentários...
 

    %d