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ARIMA
Uma gaivota – dizes.
Sim, uma gaivota
passa distante e arde.
O teu rosto é azul,
e contudo está cheio
do oiro da tarde.
Uma gaivota.
Alma do mar e tua,
abandona-se à luz.
E na boca nem eu sei
se me nasce o coração
ou é a lua.
QUE VOZ LUNAR
Que voz lunar insinua
o que não pode ter voz?
Que rosto entorna na noite
todo o azul da manhã?
Que beijo de oiro procura
uns lábios de brisa e água?
Que branca mão devagar
quebra os ramos do silêncio?
QUE DIREMOS AINDA?
Vê como de súbito o céu se fecha
sobre dunas e barcos,
e cada um de nós se volta e fixa
os olhos um no outro,
e como deles devagar escorre
a última luz sobre as areias.
Que diremos ainda? Serão palavras,
isto que aflora aos lábios?
Palavras, este rumor tão leve
que ouvimos o dia desprender-se?
Palavras, ou luz ainda?
Palavras, não. Quem as sabia?
Foi apenas lembrança doutra luz.
Nem luz seria, apenas outro olhar.
Os poemas, de Eugénio de Andrade, foram publicados no livro Mar de Setembro editado pela primeira vez em 1961.
Nota sobre as fotografias: É deliberada a desfocagem observada nas fotos – Nem luz seria, apenas outro olhar.